tag:blogger.com,1999:blog-87784800987681750532024-03-14T03:17:04.770-03:00Chubble & EuEsse não é um blog sobre mim.
Nem mesmo sobre o que leio ou escrevo.
É um blog sobre o Chubble, e sobre o que ele me obriga a ler e escrever.Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.comBlogger23125tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-58301290042476337412016-03-10T01:54:00.000-03:002016-03-10T02:02:44.204-03:00Dá licença... e se eu não quiser ser musculoso?<div class="MsoNormal" style="text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">“Vocês acabaram de ser bombardeados com endorfina! O
hormônio do prazer!” diz a professora de spinning após liberar os alunos
triturados e empapados de suor que terão câimbras na bunda após sofrer com o
banco duro das bicicletas aeróbicas. O exercício pode ser uma tortura, mas
realmente, nos dá ânimo e disposição pra um resto de dia bem sorrido. Como se
queimar calorias sobre aqueles demoníacos aparelhos de metal nos fizesse sentir
que somos mais úteis do que amebas. A preguiça atrapalha. A vontade de fugir
pra comer uma coxinha também. Mas render-se a academia e sofrer aquela dose matinal
de exercícios não dá apenas um prazer pós-treino, dá um diferencial na
qualidade de vida.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Correto?</span></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://3.bp.blogspot.com/-rchOPXvqxYM/VuD6aaAD20I/AAAAAAAASrg/5Xdo-s8W-yo/s1600/academia.gif" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="180" src="https://3.bp.blogspot.com/-rchOPXvqxYM/VuD6aaAD20I/AAAAAAAASrg/5Xdo-s8W-yo/s320/academia.gif" width="320" /></a></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Mas este não é um texto didático
para alunos de fundamental falando sobre a importância da atividade física.
Porque disso todo mundo já sabe. Esse texto é pra falar de algo que muita gente
já sabe, mas não se arrisca a falar.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<a href="https://1.bp.blogspot.com/-g4lqqKwvbNA/VuD3_jtQ7vI/AAAAAAAASrQ/xnxI337azmI/s1600/monstros1.gif" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" height="170" src="https://1.bp.blogspot.com/-g4lqqKwvbNA/VuD3_jtQ7vI/AAAAAAAASrQ/xnxI337azmI/s320/monstros1.gif" width="320" /></a><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Os instrutores da academia.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Possuem uma simples função:
instruir.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Mas é claro, que dentro de todo
grupo de seres humanos, há sempre alguns diferenciados... no mal sentido. E é
destes especificamente que estou falando aqui. Dos instrutores que vão além de
instruir.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Chubble sabe bem que nunca fui
do tipo dotado de resistência física, qualidade gerada por nossas constantes
bacias de Doritos durante episódios de séries de TV. Começar a academia há
alguns meses não foi uma tarefa fácil. Mas todo pequeno sedentário deve começar
do início. Com calma e persistência.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> </span></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><a href="https://1.bp.blogspot.com/-FveaOkdgxQw/VuD6678_LMI/AAAAAAAASrk/0M0wN6Vp4Ck/s1600/academia2.gif" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://1.bp.blogspot.com/-FveaOkdgxQw/VuD6678_LMI/AAAAAAAASrk/0M0wN6Vp4Ck/s1600/academia2.gif" /></a></span></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Mas mal começam os treinos, e lá
vem um dos instrutores e ri na minha cara, porque eu não consigo fazer um dos
exercícios de peso até o fim. Dá licença, senhor, se eu fosse profissional, eu
seria instrutor, e não aluno.<o:p></o:p></span><br />
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Pois então que lá veio a outra
instrutora durante um dos exercícios de bíceps que, pra variar, eu não sei bem
o nome.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> “- Vamos! Você não está
levantando direito! E pode aumentar esse peso!<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> - Eu sei. Tenho dificuldade com
esse exercício. Não tenho força nos bíceps. É a primeira vez que...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> - Vamos! Levanta!<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> - Não consigo ir mais do que
isso! Vou abaixar um pouco o peso...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> - Abaixar? Vai abaixar pra 15?<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> - Com o tempo, eu vou
aumentando, mas por enquanto meus braços não pegam 20 quilos...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> - Vai colocar 15 quilos?! Isso
eu pego numa mão só.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> - Sério? Ainda bem que quem tá
fazendo esse aqui sou eu e não você.”<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Dá licença, moça? Em que momento
no contrato da academia a sua opinião veio inclusa nos benefícios? Sei que seu
serviço é estimular o pessoal a se esforçar cada vez mais. Mas se eu tô sentido
a porra do meu braço latejando, eu não vou aumentar a bosta do peso ainda mais!
Talvez amanhã...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> O que a tal moça e alguns outros
do local não entendem é que nem todo mundo ali está procurando ficar com os
músculos do braço definidos no tamanho de melões. Alguns simplesmente estão
fazendo uma atividade física por questões de saúde.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Existe gente, tipo Chubble e Eu,
que decidiu encarar a vida ali no meio dos aparelhos porque sabe que a saúde
pede, mas não porque decidiu se render aos tão falados “padrões de beleza”.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Estou morrendo no spinning, sofrendo na esteira, me
acabando em abdominais, mas não tô a fim de ser do tipo que se gaba pela
quantidade de quilos que carrega. Se fosse orgulhoso, preferiria me gabar pela
quantidade de livros que eu leio.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Então, querido Instrutor que ri na minha cara, e prezada
Instrutora que critica minha falta de preparo. Fodam-se. Eu continuarei pegando
a quantidade de quilos que eu der conta. E aumentarei o peso um pouco de cada
vez, respeitando meus próprios limites.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">No final do dia, quem paga a conta da academia sou eu
mesmo. E, por mais que eu saiba que vocês dois não estão lendo esse texto, eu
fico feliz em desabafar com o Chubble sem ter que perder a educação em público.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif; line-height: 107%;">Mas saiba que da
próxima vez que um de vocês vier dar opinião onde não deve, minha cabeça estará
formulando uma única imagem:</span></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="https://2.bp.blogspot.com/-AeL9bevoZNQ/VuD3T5phiGI/AAAAAAAASrI/teKcpdComLQ/s1600/fuck.gif" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="180" src="https://2.bp.blogspot.com/-AeL9bevoZNQ/VuD3T5phiGI/AAAAAAAASrI/teKcpdComLQ/s320/fuck.gif" width="320" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif; line-height: 107%;"><br /></span></div>
Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com7tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-58566069758356016602016-02-03T17:06:00.003-03:002016-02-03T17:06:48.073-03:00FurtoLeitores nos furtam histórias<br />
O menino<br />
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-ozEkbMs2OOw/VrJdJId6OBI/AAAAAAAASZA/O82WFpkPvqU/s1600/cheiro2.gif" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" height="196" src="http://2.bp.blogspot.com/-ozEkbMs2OOw/VrJdJId6OBI/AAAAAAAASZA/O82WFpkPvqU/s320/cheiro2.gif" width="320" /></a>roubava o cheiro dos livros.<br />
Dos aromas<br />
tirava memórias e as depositava em frascos de vidro<br />
Em seu quarto, a coletânea<br />
de livros que havia lido e bem escondido extraíra o perfume.<br />
Na prateleira, cada frasco<br />
cheirava uma história.<br />
<br />
Damas nos furtam rosas,<br />
mas no bar de tapas da esquina a dama furtou-lhe a atenção,<br />
Portando o tal livro entre os dedos – e verde-água as vestes que usava.<br />
O crescido menino a cheirava e o surpreendia tamanho perfume<br />
Como pode um humano exalar<br />
aquilo que só os tais livros cheiravam?<br />
Encontros,<br />
Risadas,<br />
O beijo.<br />
Casal tão íntimo, ainda tão vívida a dura questão.<br />
No sorriso e coração aberto, mostrou-lhe a dama em verde-água<br />
Que quando escrevia livros próprios,<br />
Criava cheiros de inspiração. <br />
<br />
Livros nos furtam tempo,<br />
Deles furtamos tudo.<br />
Cada aroma, cada odor.<br />
De seu reles escritor.<br />
Escritora aquela dama, lhe deu livros,<br />
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-PG8_GGKpGgs/VrJcvdQCr7I/AAAAAAAASY8/ivAtI0X-dVs/s1600/cheiro.gif" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" height="180" src="http://2.bp.blogspot.com/-PG8_GGKpGgs/VrJcvdQCr7I/AAAAAAAASY8/ivAtI0X-dVs/s320/cheiro.gif" width="320" /></a>Deu-lhe amor.<br />
- Mas todos os cheiros vêm de pessoas?<br />
- Toda essência vem de um alguém.<br />
Um livro é um porta-memórias,<br />
Disso a autora sabia bem.<br />
E juntos viveram romance,<br />
Sentiram o drama e a ficção.<br />
<br />
Anos mais tarde, se foi a dama,<br />
Resta na cama o viúvo leitor<br />
Na prateleira, um único frasco<br />
que não possui mais cheiro de livros,<br />
mas o cheiro da nuca da dama – que lembra manhãs bem despertadas<br />
E quem sabe um dia, o não-mais-menino decida<br />
derramar o frasco em algum livro<br />
de sua própria autoria<br />
venda<br />
e compremos<br />
<br />
Pois que bom leitor não há de se apaixonar<br />
por um livro com cheiro de amor?<br />
<br />
<br />
<br />Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com13tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-81233937353896363762016-01-28T20:59:00.003-03:002016-02-03T19:52:33.641-03:00Carta para Simélia<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
</div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Cara Simélia,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Uma vez mamãe me disse que o tempo
passa mais rápido à medida que envelhecemos. Assim como quando me dissera que
eu não devia furar o maldito piercing, ou que comida esquentada no micro-ondas
nos enchia de radiação, não dei ouvidos à ela. E vejam só agora... anos se
passaram. Décadas, acredito eu. E já não sei mais se é apenas o tempo tão longo
aquilo que nos distancia.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Confesso, ainda me lembro da sua
obsessão com o tempo quando éramos crianças. Quando decidiu, com apenas sete
anos, que seria uma brilhante cientista. Em suas ingênuas palavras, seria a
primeira a construir a fantástica máquina do tempo, capaz de levá-la a qualquer
desventura do passado. Os anos se passaram e a fantasia passou a se fundir com
pesquisas reais e estudos intensos acerca dos mistérios da física. Todos os
professores indagaram como uma adolescente poderia ter produzido um artigo tão
complexo sobre a teoria do espaço-tempo ainda no ensino médio.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Naquela época, os sonhos já haviam
amadurecido. As conversas bobas sobre viagens temporais haviam sido descartadas
pelas próprias leituras à Stephen Hawking. Mas o desejo de desbravar a ciência
ainda permanecia. Seria reconhecida no campo de pesquisas da relatividade. E,
um dia, ainda revolucionaria o modo como as pessoas viam a ciência.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Mas, Simélia, por que deu ouvidos ao
seu pai? Se sabia que o velho era um tolo machista que subjugara sua própria
mãe durante todos os anos de casamento... por que cedera a suas vontades? Eu e
você sabemos bem que jamais fora adepta do pensamento de que mulheres naquela
idade deveriam arrumar parceiros com urgência. Mas, ainda assim, começou o
namoro com aquele imbecil. O detestável filho do Senhor Prefeito.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Seu pai sempre foi um grande puxa-saco
quando o assunto é política, não é mesmo? Então que ele lambesse as bolas do
maldito filho do prefeito, e não você! O garoto nunca te respeitou, desde o
primeiro encontro! Ele a privou de uma vida toda de descobertas no florescer da
sua sexualidade tão resguardada. Cada toque, cada beijo, cada aperto, jamais
lhe instigou ao desejo... mas a levava ao receio. Ao medo. Não apenas porque
você sabia que o tal moço é um ogro. Mas porque você sabe bem o que deseja.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Pode nunca ter tido um relacionamento,
mas seu coração soube na primeira vez que a viu. O filho do prefeito pode ter
sido um jegue sem igual. Mas a irmã dele, Clarice... Você jamais se esqueceu da
primeira vez que fitou aqueles olhos castanhos. Da forma como descobriu que a
simplicidade do castanho podia guardar um brilho indescritível.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Como dói em mim saber que você se
culpou todas as vezes em que fugiu com Clarice pelos parques da cidade. Que
chorou sozinha e perguntou a si mesma se era certo desejar aquele beijo, aquele
abraço, aquele sorriso, quando seu pai tanto repetia que você e Clarice deviam
conquistar homens de qualidade. Os passeios secretos durante a madrugada, as
mensagens enviadas das mais variadas e criativas maneiras, os girassóis que ela
roubava para ti, e os pedaços de pizza que você roubava para ela, as músicas
que ouviam juntas, o toque dela em sua mão, em seu corpo... tudo isso a faria
completa. Mas você recusou-se a aceitar.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Ainda assim, passou anos ao lado de um
brutamonte, aguentando todos os insuportáveis defeitos, só pra que não se
afastasse da cunhada-amante.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Simélia, dói em mim ainda mais...
lembrar que estive contigo quando seu pai desferiu-lhe aquele tapa. O doloroso
tapa de vergonha quando você e Clarice foram descobertas. Não era apenas uma
garota... era a filha do prefeito, o que fazia da vergonha um vexame ainda
maior.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Eu sei que ainda chora por saber que
Clarice fugiu da família e foi morar com parentes distantes, decidida a
terminar a faculdade longe dali. Sei também que o motivo das lágrimas é que não
teve coragem o suficiente para ir junto com ela. Que não aceitou o convite,
pois achou que não era o certo a se fazer. O medo tomou conta de seus sentidos,
Simélia, e você deixou que o maldito prefeito fizesse o filho colocar este anel
em seu dedo. O anel que o faz chamá-lo de noivo, e brotar um sorriso no rosto
de seu pai.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Mas repense, minha querida... repense
se é mesmo prudente baixar a cabeça. Sabe bem como será esse casamento. Nada de
conversas carinhosas, ou passeios românticos. Não que você tenha sonhado alguma
dessas coisas com ele. Mas não haverá amor. Serás para ele apenas uma
companhia. Um troféu social que ele exibirá nas festas na prefeitura, e uma
boneca de trapos destinada a ser seu brinquedo sexual. Jamais sentirá prazer,
Simélia. Jamais sentirá amor.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">E o pior... é que com o tempo vai
acabar se acostumando com isso. Irá entender que não há mais tempo para estudos
científicos, ou trabalhos em laboratórios com pesquisas sem propósito. Seu
dever é estar ao lado do teu homem. Cuidar da casa... Engravidar.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Ah, sim... terá lindos filhos,
Simélia. Na verdade, apenas um, já que um único será o bastante para seu marido
provar sua virilidade, já que ele nunca realmente desejou crianças. Mais
especificamente, será uma filha, com os cachos iguais aos teus. Até o
nascimento dela, sua mente já terá apagado toda sua independência.
Completamente submissa ao seu homem, o único contato que terá com a física e
química as quais tanto amava estudar será através dos produtos de limpeza com
os quais limpará a casa, enquanto faz a bebê pegar no sono.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Teu marido será rígido. Precisará
fazer suas vontades. Com o tempo, vai até se converter para a religião dele. A
culpa não está naquela igreja é claro, mas no mau uso que as pessoas fazem
dela. Lá dentro, você terá certeza de que estará no caminho certo. E aprenderá
a confundir o fato de que está “conformada com a vida”, com felicidade. Até
mesmo os socos que seu marido lhe dará de vez em quando serão aceitos, sem
questionar. Apanhar é bom para amadurecer a mente.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Pelo mesmo motivo, baterá em sua
filha. Tapas cada vez mais fortes serão corretivos para fazer dela uma menina
de respeito. Sua doce Carolina. Irá, crescer, crescer... e deixar de ser tão
doce quanto fora na infância. Ela não irá aceitar toda a rigidez vinda do pai,
mas de você tão pouco receberá apoio.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Pois você terá medo. Já que verá
refletido nos olhos de sua Carolina a mesma paixão proibida que sentiu nos teus
olhos há anos. No momento em que vê-la de mãos dadas a uma garota, chamando de
romance aquele pecado imperdoável.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Você jamais poderá deixar que o marido
descubra sobre o namoro secreto da filha! Irá puni-la, castiga-la. Mas ela já
será maior de idade. Irá cuspir em seu rosto e gritar palavras grotescas,
retribuindo toda a falta de carinho com a qual você a tratou, e indo embora de
sua casa para sempre. Você não saberá se ela fugiu com a namorada, ou se está
perdida pela cidade. Encontrá-la será impossível. E a culpa será sua...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-B_OusOlJxrg/Vqqqa3ghEBI/AAAAAAAASE8/0K5qxmVNBko/s1600/sim%25C3%25A9lia.gif" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" src="http://1.bp.blogspot.com/-B_OusOlJxrg/Vqqqa3ghEBI/AAAAAAAASE8/0K5qxmVNBko/s1600/sim%25C3%25A9lia.gif" /></a><span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Seu marido ficará possesso. Você terá
perdido a filha dele! Os tapas serão mais fortes, e você passará a não
conseguir mais segurar as lágrimas. Não apenas porque os tapas doem, mas porque
sabe que perdeu sua filha no momento em que a impediu de viver pelo amor.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Com o tempo, sua mente cansada já não
mais se preocupará com o que é certo. Os antigos conhecimentos sobre química
permitirão que você sabiamente coloque as toxinas no café de seu homem. A morte
dele jamais a terá como suspeita. Você Simélia, será viúva. Mas ao contrário do
que pensa, a ida dele não a fará feliz.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Pois só então perceberá como os anos
se passaram. Quando, no velório de teu marido, assistir a chegada de sua
cunhada. A fantástica Clarice continua bela após tantas décadas longe de ti.
Mais bela ainda é a mulher que a acompanha, a qual ela chama de esposa, com a
qual é mãe de dois filhos. Os filhos de Clarice a fazem lembrar de Carolina. Ou
talvez, sejam apenas seus desejos de ter sido você a ter tido filhos com ela.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Mas, após tanto tempo, mamãe ainda
está certa. Terão sido mesmo os anos de comida esquentada no micro-ondas
responsáveis pelo câncer? Bom... tudo o que sei é que o tumor se espalha. E ao
mesmo tempo em que me derrota, é também minha única companhia. Pois há tempos
que é o único, além dos médicos, que entra em contato com meu corpo.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Estou viúva. Meu verdadeiro amor
superou-me há anos para encontrar os olhos de uma outra mulher. E já compreendo
que Carolina jamais irá voltar. Que motivos ela tem, afinal, pra sentir falta
da mãe?<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Ah, Simélia, pois eu lhe digo com todo
o meu âmago... como eu queria que a garota que foi aos sete anos tivesse se
esforçado um pouco mais. Já não mais ligo para o que dizem os cientistas. Hoje,
queria eu que ela tivesse conseguido. Que se tornasse uma pomposa cientista, e
criasse a sonhada máquina do tempo. Pois somente com essa máquina dos sonhos,
cara Simélia, seria possível que eu lhe entregasse essa carta. Somente com ela
seria possível que você a lesse e descobrisse que a vida não precisa ser levada
conforme aquilo que lhe dizem que é o certo.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Mas não há tal máquina, Simélia. E não
há mais chances para nenhuma de nós duas. Então, gostaria apenas que soubesse de
uma coisa: Depois de tanto sofrimento, de tantas lágrimas... Eu ainda estarei
aqui. E pode ter demorado muito tempo, mas eu finalmente consigo enxergar a
beleza que há em você, garota. Você não é apenas inteligente e carismática, como
dizia mamãe. É uma mulher forte e madura, capaz de resistir aos piores
tormentos. Não há ninguém que lhe complete, Simélia. Pois você já é completa
por si só. Você é perfeita.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Eu só queria que pudesse saber
disso...<o:p></o:p></span></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-cPrhHp87SDk/VqqrNQNORiI/AAAAAAAASFM/kqSQKvGQZMk/s1600/woman.gif" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="176" src="http://1.bp.blogspot.com/-cPrhHp87SDk/VqqrNQNORiI/AAAAAAAASFM/kqSQKvGQZMk/s320/woman.gif" width="320" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Desejo força e esperança. Você é uma guerreira,
garota.<o:p></o:p></span></div>
<div align="right" class="MsoNormal" style="text-align: right; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Com abraços, de sua grande admiradora,<o:p></o:p></span></div>
<br />
<div align="right" class="MsoNormal" style="text-align: right; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;">Simélia.</span><o:p></o:p></div>
<div align="right" class="MsoNormal" style="text-align: right; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;"><br /></span></div>
<div align="right" class="MsoNormal" style="text-align: right; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "georgia" , "times new roman" , serif;"><br /></span></div>
<div align="right" class="MsoNormal" style="text-align: right; text-indent: 35.4pt;">
<br /></div>
<div align="right" class="MsoNormal" style="text-align: right; text-indent: 35.4pt;">
<br /></div>
<div align="right" class="MsoNormal" style="text-align: right; text-indent: 35.4pt;">
<br /></div>
Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com40tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-89249220589989121312016-01-26T20:46:00.004-03:002016-01-26T20:49:40.436-03:00Inutilidades da Vida<div class="MsoNormal">
<i>(Sobre eu ter falado que usaria as férias pra escrever e produzir, e acabar gastando uma semana inteira jogando videogame e experimentando sabores de jujuba...)</i></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-indent: 35.4pt;">
Há alguns dias me flagrei
pensando, durante uma partida de dominó na qual Chubble acidentalmente engoliu
uma das peças acreditando ser chocolate... quem escreveu as regras da utilidade
da vida?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-indent: 35.4pt;">
Provavelmente um tirano ditador
que sofria de calvície desde os primeiros anos da maturidade, que num nada belo
dia decidiu que seriam considerados úteis as ações que, direta ou
indiretamente, enchessem os bolsos de dinheiro ou vale-trocas de postos de gasolina.
Estudar = útil, trabalhar = útil, dançar zumba com seu animal de estimação =
perda de tempo.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-indent: 35.4pt;">
E não importa nosso estado de
humor. Mesmo nos dias mais inúteis de nossa mente, somos praticamente
empurrados em direção a uma pilha de afazeres que gritam “Vamos! Tempo é
dinheiro! Seja alguém na vida! Produza! Você é um homem ou um saco de
alcachofras?!”<o:p></o:p></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://3.bp.blogspot.com/-teIbT9Dqn1g/VqgE5rN-nrI/AAAAAAAASDI/iRioo_dJeMs/s1600/giphy2.gif" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="http://3.bp.blogspot.com/-teIbT9Dqn1g/VqgE5rN-nrI/AAAAAAAASDI/iRioo_dJeMs/s1600/giphy2.gif" /></a></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-indent: 35.4pt;">
Mas será mesmo? Afinal, pra que é
que trabalhamos tanto? Precisamos de dinheiro pra que possamos ter condição de
comprar roupas, livros, ingredientes para receitas de bolo Marta Rocha, e tudo
mais aquilo que acreditamos (erroneamente ou não) nos fazer felizes. Qualquer
coisa que nos faça sorrir.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-indent: 35.4pt;">
Sorrir... no frigir dos ovos de
codorna, não é isso que estamos sempre buscando? Sorrisos. Consideramos útil
tudo aquilo que, a longo prazo, um dia nos dê dinheiro pra que possamos ter
condição de sorrir, já que vivemos numa sociedade que só sorri com aquilo que
se compra.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-indent: 35.4pt;">
“Faz sentido”, Chubble diria,
“Não há como sorrir sem pagar um bom ortodontista”. Bom... se tivesse lido com
atenção <a href="http://chubbleeeu.blogspot.com.br/2016/01/masque-hoje-um-chiclete.html">um de meus antigos poemas</a>, ele saberia que não. Sorrisos não podem ser
comprados. Por mais que isso seja difícil de se entender hoje em dia.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-indent: 35.4pt;">
Nunca fui uma pessoa que gosta de
extremismos. Assim, da mesma forma que não aprovo alguém que se entrega
inteiramente à escravidão de um emprego, não digo que acho sensato se render a
uma vida de ações vazias e sem propósito. Mas o que defendo nesse pequeno
desabafo seja talvez uma questão de equilíbrio.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-indent: 35.4pt;">
Um equilíbrio onde saibamos
apreciar as coisas inúteis da vida. Ações bobas como apostar corrida com os
amigos, se submergir num livro por horas, brincar de adedonha ou até mesmo
tirar aquela boa soneca. Ações que nos tragam sorrisos. Sem que precisemos ter
que trabalhar anos e anos, pra só depois comprarmos bens materiais que um dia
nos façam arreganhar os dentes em felicidade.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-indent: 35.4pt;">
Ser inútil faz bem de vez em
quando. Afinal, se inútil é aquilo que nada produz... uma reles ação que lhe
brote um sorriso, já possui utilidade.<o:p></o:p></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-aFnBLVUjbhk/VqgFJYV-plI/AAAAAAAASDQ/Wb09WxvMhSI/s1600/tumblr_m56ha3A38o1r5fqqfo1_500.gif" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" height="155" src="http://2.bp.blogspot.com/-aFnBLVUjbhk/VqgFJYV-plI/AAAAAAAASDQ/Wb09WxvMhSI/s320/tumblr_m56ha3A38o1r5fqqfo1_500.gif" width="320" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="text-indent: 35.4pt;">
Por isso, não se acanhe. Você não
precisa ser mega-produtivo todos os dias. Use agora aqueles bons minutos. Vá
assistir aquele filme, assaltar aquela geladeira, ou estralar aqueles dedos
dormentes. Coloque os braços pra trás e deixe que cada músculo se espreguice
numa preguiça risonha.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal" style="text-indent: 35.4pt;">
Inutilize-se. Só por hoje. De vez
em quando, faz bem. Faz sorrir. Faz-se útil.</div>
<div class="MsoNormal" style="text-indent: 35.4pt;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="text-indent: 35.4pt;">
<br /></div>
Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com6tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-85330481844282670642016-01-24T12:38:00.003-03:002016-01-24T12:40:05.683-03:00Masque hoje um chiclete<div class="MsoNormal">
Masque hoje um chiclete<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<br /></div>
<div class="MsoNormal">
pois a vida é muito mais<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
que se ater a arcadas dentárias<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e de um dentista limitações.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
proibições<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
enfadonhamente otárias<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
que deixam-te até<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-Ohjs4NDZ-sE/VqTvyDkXUfI/AAAAAAAASBw/Ooo5T198n_U/s1600/Ellie-up-13660771-608-336.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" height="176" src="http://2.bp.blogspot.com/-Ohjs4NDZ-sE/VqTvyDkXUfI/AAAAAAAASBw/Ooo5T198n_U/s320/Ellie-up-13660771-608-336.jpg" width="320" /></a>com sorriso completo<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
e boca cuidada mais que bela.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
mas cá entre nós,<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
a vida não é feita pra sorrir correto.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
quer algo melhor que sorriso banguela?<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
esqueça o flúor, e a fuga tente.<o:p></o:p></div>
<div class="MsoNormal">
sorriso não se vê<o:p></o:p></div>
sorriso se sente.<br />
<br />
<o:p></o:p>Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-44439378993048337432015-04-23T00:27:00.000-03:002016-02-13T12:29:57.513-03:00Relatos de um Gnomo de Jardim<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<br /></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Há
três décadas e meia que moro em frente à grande casa de tijolos amarelos, e há
trinta e cinco anos que observá-la em rotina é meu fazer mais prazeroso em dias
de tédio.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-1jtwU3yOqf0/VThmLrUue5I/AAAAAAAANy8/muGSk5-menU/s1600/IMG_0452.JPG" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="240" src="https://2.bp.blogspot.com/-1jtwU3yOqf0/VThmLrUue5I/AAAAAAAANy8/muGSk5-menU/s1600/IMG_0452.JPG" width="320" /></a><span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">É
curioso observar seres humanos. Suas idas e voltas, suas rotas e vindas. Seus
delírios, paixões e devaneios. O modo como eles vivem, mas deixam de observar.
Cabendo a nós, móveis, imóveis e mobílias assistir a suas histórias e apreciar
suas insanidades. Sim... são uma espécime devidamente peculiar. Foi o que soube
no dia em que os primeiros moradores do grande casarão trancaram a filha
adolescente no quarto do segundo andar.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Como
todo bom pai se esquece de que um dia foi jovem, o já não mais jovem Senhor Fagundes
trancara Sofia em seus aposentos, proibindo-a permanentemente de manter contato
com o garoto mais velho que a paquerava no fim da rua.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Mas
é fascinante observar como os jovens sempre vencem barreiras pelo amor.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Em
sua sagaz perspicácia, Sofia passou a utilizar a caixa de correio como
instrumento de troca de mensagens. Deixava um bilhete todas as noites preso
numa fresta, o qual o apaixonado Lucas coletava durante a madrugada, e
respondia com outro recado em resposta que ela coletava pela manhã.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Pude
ler nos lábios de Sofia a mensagem deixada pelo garoto no dia em que ele lhe
escreveu dizendo que sentia sua falta, e que odiava o fato de ela estar
trancada lá em cima. Não pude evitar de me emocionar ao vê-la sussurrar e escrever
a resposta, guardando o bilhete na fresta da caixa de correspondências:<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">“Ainda
te olho todos os dias daqui de cima, com o mesmo amor que sempre tive por
você.”<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Não
me contive de ansiedade, e passei toda a madrugada de olhos atentos, aguardando
o momento em que o jovem surgiria e encontraria o recado. Naquela noite,
entretanto, Lucas não apareceu. Sofia viu-se em espanto ao notar que não
houvera resposta do garoto quando acordou no dia seguinte. Deixou seu recado
guardado no interior da fresta, acreditando que talvez mais em breve ele viesse
e encontrasse o bilhete.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Mas
é fascinante observar como paixões vêm e vão qual o vento matutino.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Nunca
soube o que houve com Lucas, mas ele nunca mais voltou. Seu desaparecimento
acarretou em choros e soluços vindos da garota do andar de cima, e o bilhete
permaneceu guardado na fresta e sem resposta.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Mas
é fascinante observar como a maturidade limpa mágoas e feridas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Sofia
passou no vestibular e foi cursar medicina em Belo Horizonte. Os pais passaram
a achar o casarão um tanto espaçoso, e venderam o imóvel para um colecionador
de bugigangas. Guilhermo era um homem esguio, que instigou minha curiosidade
desde a primeira vez que o vi entrar pela porta da frente, carregando caixas e
caixas repletas de suas coleções. Algo nele o fazia bizarramente misterioso. Talvez
fosse o cavanhaque sempre deixado por fazer, ou talvez a quantidade
surpreendente de discos de vinil que organizava nas prateleiras, todos capazes
de serem vistos pela vidraça das janelas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">E
assim, assisti curioso por dias a rotina do nobre colecionador, que
desempacotava diariamente coleções de quadros, estatuetas, vasos e itens dos
mais variados tipos, os quais preenchiam prateleiras e estantes pelos cômodos
da casa. O casarão mobiliado tornou-se brilhantemente ornamentado pelos
milhares de artefatos.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Mas
é fascinante observar como o material muitas vezes peca por não preencher o
espírito.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Enfurnado
em suas coleções, Guilhermo se sentia solitário. Sozinho e desamparado. Entrou
em depressão em uma quinzena de meses. Depressão que resultou em suicídio,
vindo do cano de um dos revólveres que possuía em sua coleção de armas, na
forma de bala que invadira sua boca, irrompera seu crânio, e fizera litros de
sangue encharcarem o chão de carpete.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">O
corpo foi levado, o caso foi abafado, e a casa posta à venda junto a todos os
itens das coleções. Por anos, entretanto, a casa vazia permaneceu. Entediado,
eu observava diariamente suas portas de entrada duplas, aguardando que um novo
morador viesse a me entreter.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Porém
não foram moradores que ocuparam minha visão nos próximos meses, mas sim o
casal de jovens de nomes Célio e Renata. Não sei bem o que queriam. Uma
aventura arriscada, ou simplesmente um local reservado para acasalamento. Em
recente maioridade, ambos moravam com os pais e não dispunham de local algum
para a devida privacidade do casal.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Mas
é fascinante observar como o desejo leva os ardentes a cometer as maiores
loucuras.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<a href="https://2.bp.blogspot.com/-LhUnD2tzSm4/Vr88SmGdwPI/AAAAAAAASg4/lpLcTF92UrE/s1600/gnomo.gif" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="156" src="https://2.bp.blogspot.com/-LhUnD2tzSm4/Vr88SmGdwPI/AAAAAAAASg4/lpLcTF92UrE/s320/gnomo.gif" width="320" /></a><span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Instigados
pela placa “Vende-se”, e sabidos dos rumores mal falados que alegavam o local
sombrio como cenário de suicídio, o jovem casal arrombou a porta e invadiu os
aposentos do casarão. Fizeram do local silencioso seu secreto e temporário
ninho de apego. Repetiam o mal feito quase que diariamente, voltando todas as
noites e invadindo o domicílio abandonado, utilizando os quartos, banheiros, a
cozinha e a sala, todos repletos de coleções artísticas e ornamentais, para
fazer aquilo que chamavam de amor.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Mas
é fascinante observar como o mundo destrói a ingenuidade.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">A
maioridade de Célio veio com o obrigatório alistamento, e o pobre jovem foi
forçado a adentrar o exército, deixando Renata desolada em espera. O casal não
voltou a invadir o casarão amarelo, e minhas espiadas em suas noites de amor
deram-se por encerradas assim. Mas não antes de deixar a casa pela última vez,
a desvirtuada Renata levou consigo um dos discos organizados na estante dos
vinis. O volume furtado de Engenheiros a permitiria ouvir incontáveis vezes a
“Infinita Highway”, a fazendo lembrar do amado por todo o tempo em que
estivesse longe em serviço militar.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Acredito
que passei mais de anos sem ver qualquer pessoa novamente na tal casa. Não sei
ao certo contar o tempo como vocês. Mas pude ver que bons períodos se passavam
pelo alterar das cores das folhas que fartavam a copa volumosa da árvore de
tronco retorcido a alguns metros de mim.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">A
casa praticamente lançada ao abandono foi furtada mais de três vezes, em crimes
consecutivos executados por quadrilhas. Logo, nenhum artefato das coleções do
antigo proprietário permaneceu em seu interior. Completamente desnuda em
ornamentos, e ainda assombrada pela história de suicídio, a residência teve um
enorme declínio em seu preço de venda. A queda dos valores foi tão alta, que um
interessado e paupérrimo pai solteiro juntou suas poucas economias e conseguiu
adquirir o imóvel.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Marcelo
e sua filha Virgínia foram a nova família a qual assisti. Um pai amoroso e
atencioso que, mesmo sem possuir muitos recursos, dava à filha toda a atenção e
tempo dos quais dispunha. Ao lado do desejo de ver a pequenina Virgínia
crescer, carregava consigo o sonho de se tornar um escritor. Suas horas vagas
eram quase que completamente investidas na tentativa de escrever seus romances
e contos. O tempo tornava-se pouco, e foi necessário que contratasse uma babá
para cuidar de Virgínia. Contratou a jovem Denise, que morava ao fim da rua, e
tentava reunir economias para pagar a faculdade.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Mas
é fascinante observar como mesmo os sonhos mais sinuosos às vezes necessitam de
estímulo.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">A
escrita de Marcelo por anos permaneceu empacada. Por mais que fosse criativo,
necessitava de algum insight inspirador que lhe trouxesse alguma ideia
original. Foi numa tarde de veraneio que uma mulher bateu a porta. Me esforcei
para reconhecê-la enquanto Marcelo a atendia, até perceber que, por mais que
sua aparência fosse bem mais velha do que eu me lembrava, era ninguém menos do
que Renata.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">A
já não mais jovem mulher decidira retornar ao casarão que há anos não invadia,
na intenção de devolver o disco de vinil que furtara há tempos. Agora que
estava casada com Célio, com quem fora mãe de dois filhos, não precisava mais
de músicas na vitrola para saciar a falta que o amado lhe fizera.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Do
meu canto esverdeado no gramado, pude enxergar na expressão distante de Marcelo
a maravilhosa ideia que surgiu em sua mente quando Renata lhe entregou o disco.
Pude ler em seus olhos o modo como começou a pensar que, assim como a história
daquele casal, muitas outras haviam passado pela mesmíssima residência.
Decifrei no sorriso do aspirante à escritor que ele finalmente percebera que
uma casa é repleta de memórias, e que tal concepção era uma ideia excelente para
um livro.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<a href="https://3.bp.blogspot.com/-aVkTM4N0khk/Vr9JrzqYBeI/AAAAAAAAShU/R6_t4x1wPJQ/s1600/write.gif" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" height="112" src="https://3.bp.blogspot.com/-aVkTM4N0khk/Vr9JrzqYBeI/AAAAAAAAShU/R6_t4x1wPJQ/s200/write.gif" width="200" /></a><span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Após
a ida de Renata, enxerguei pela janela o afoito Marcelo sentar-se em frente ao computador
e escrever por horas, relatando em suas páginas um romance no qual de maneira
criativa inventava histórias diversas que haviam ocorrido naquela casa.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Foram
necessários meses de contatos e esperas, mas uma editora logo se interessou
pela obra. O romance foi publicado, e em pouquíssimos anos tornou-se um sucesso
em nível nacional.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Mas
é fascinante observar como a fama sobe aos olhos mais rápido que a paixão.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Focado
em sua nova carreira de escritor profissional, Marcelo deixou a filha Virgínia
sobre os cuidados da babá, e mudou-se para uma segunda casa em São Paulo, onde
podia ter contato mais direto com editoras para cuidar de suas futuras
publicações.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Ainda
que sentisse a falta do pai, Virgínia era sustentada por uma farta mesada que
provinha do mesmo rotineiramente, enquanto a babá Denise ocupava o papel de pai
e mãe, e se afeiçoava à garota cada vez mais.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Mas
é fascinante observar como ingênuas crianças crescem e tornam-se jovens
insensatos.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Após
envolver-se numa relação promíscua, Virgínia engravidou aos dezesseis anos.
Rebelando-se numa crise existencial por diversos motivos sem cabimento,
abandonou o filho recém-nascido aos cuidados de Denise, e fugiu com o namorado
para uma cidadezinha distante.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Denise,
ainda recebendo de Marcelo o dinheiro mensal para os cuidados da casa, deixou de
lado quaisquer outras perspectivas de emprego e entregou-se inteiramente ao
bebê. Deu a ele o nome </span><br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;"><a href="https://1.bp.blogspot.com/-iiM_nTJVma4/Vr9LsYKLwJI/AAAAAAAAShg/T3mvl2jyFlE/s1600/gnomo1.gif" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" height="135" src="https://1.bp.blogspot.com/-iiM_nTJVma4/Vr9LsYKLwJI/AAAAAAAAShg/T3mvl2jyFlE/s320/gnomo1.gif" width="320" /></a></span></div>
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">de Danilo, e amou-o como a um filho. Passou a morar no
casarão amarelo, como se este fosse seu, ainda que sustentada pelo dinheiro do
patrão que nunca deixava de chegar.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Foi
fascinante para mim enxergar como a não mais babá deu a casa um estilo próprio.
Repintando as paredes, trocando os azulejos, e organizando toda a decoração
para uma atmosfera mais colorida e harmônica. Incomodava-a, contudo, algumas
manchas avermelhadas que jamais saíam do carpete. Manchas estas que ela não
sabia de onde vinham, mas que eu me lembrava bem de quando haviam sido
respingadas do crânio estourado de Guilhermo.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Denise
foi então em busca de uma loja de artefatos de limpeza, à procura de um
alvejante que pudesse as tais manchas eliminar. Foi atendida por um moço de
charmoso cavanhaque chamado Victor, que se dispôs a atendê-la pessoalmente,
indo até sua casa e testando o produto no carpete. O alvejante, contudo, fora
apenas uma desculpa.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Em
sua ida até a residência, após terminado o serviço, Victor acabara sendo
convidado para um jantar com Denise e o pequeno Danilo. Um jantar no qual o
atendente se dera tão bem com o jovem garoto, que acabara chamando a atenção da
mulher. Emocionei-me verdadeiramente ao enxergar pela janela a cena magnífica
entre os três. Eram apenas um homem, uma mulher e um garoto, sem laços de
sangue algum. Entretanto, pareciam verdadeiramente agir como uma família.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Mas
é fascinante observar como é mesmo por ações, e não por genética, que uma
família se forma enfim.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<a href="https://2.bp.blogspot.com/-CmZqDPkw7ic/Vr9L2X96x2I/AAAAAAAAShk/ilrwc9NV70M/s1600/gnomo3.gif" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="179" src="https://2.bp.blogspot.com/-CmZqDPkw7ic/Vr9L2X96x2I/AAAAAAAAShk/ilrwc9NV70M/s320/gnomo3.gif" width="320" /></a><a href="https://4.bp.blogspot.com/-o1D4ZkCgfrI/Vr9GL_aWv5I/AAAAAAAAShI/4PKX1vLnZBE/s1600/gnomo2.gif" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><br /></a><span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Victor
e Denise, após alguns anos, se casaram numa simples cerimônia e adotaram Danilo
como filho oficialmente registrado. Por
anos me deleitei com o romance de ambos, que habitavam o casarão como se a eles
pertencesse. O dinheiro que ainda vinha aos montes do escritor cada vez mais
famoso e abastado permitia que a nova família ali vivesse com fartura. <o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Na
posição que ocupava do jardim, me divertia ao ver o modo como se deitavam no
meu gramado em frente à casa, e observavam as estrelas. Juntos, nomeavam as
constelações com apelidos bobos, e murmuravam sobre a beleza dos tais pontos
brilhantes lá de cima.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Era
incrível para mim também ver o pequeno Danilo crescer e se tornar um homem.
Victor e Denise, já mais velhos, o haviam educado muitíssimo bem.
Incentivaram-no a levar a sério a educação acadêmica, o que o levou a cursar a
faculdade de Direito e tornar-se um reconhecido e pomposo advogado anos mais
tarde.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;"> Com o filho formado, casado e já morando em casa
própria, Denise e Victor aproveitaram os anos de casamento vivendo juntos na
casa de tijolos amarelos. Amavam-se incondicionalmente, e juntos repetiam
sempre o feito de observar as estrelas que tanto os entretinham. Diziam que o
amor era para sempre, e que após décadas de casamento, um dia repousariam
juntos no brilho mágico das constelações.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Mas
é fascinante observar como o destino às vezes intervém com curvas trágicas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Assisti
com pesar ao sofrimento do casal quando Victor descobriu o tumor, e começou o
tratamento. Foi quando enxerguei nos humanos a fabulosa arte de lutar pela
vida. E a estupenda loucura de lutar pelo amor.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Ainda
assim... Victor se foi. Faleceu numa tarde nublada, deixando a pobre Denise num
desolamento inconsolável. Observei-a chorando por dias... semanas... meses...
tornando-se triste, deprimida e por fim louca.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Assisti
assustado a sua reação quando ela decidiu pôr fim a todas as memórias do
casarão. Quando rogou em voz alta que não deixaria que o marido se tornasse
apenas mais uma história... mais uma memória nos tijolos amarelos que acabaria
indo parar nas páginas de um dos livros de Marcelo.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Decidida
a fazer com que o marido fosse o último e eterno habitante daquela casa,
desfez-se do antigo estoque de uísque, despejando o líquido inflamável pelo
carpete e ateando fogo em toda a construção.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Assisti
às lágrimas brotarem de seus olhos enquanto o casarão era consumido pelas
chamas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Mas
é fascinante observar como os humanos são propensos à loucura.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Apesar
de que... eu, em minha singela textura de porcelana, com este gorro pontudo e
este sorriso que daqui nunca sai, sonho ainda em um dia saber como é isso.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Sonho
em saber como é possuir essa loucura chamada amor. Essa loucura que permite à
Denise que, por motivo nenhum, abra a caixa de correio e vasculhe seu interior.
Lá dentro, ela encontra uma fresta suja e empoeirada. E dentro da fresta,
percebe que há preso um bilhete. Abre. Lê. E, por fim, chora. Chora
incontrolavelmente, pois as palavras ali escritas mexem com algo dentro dela.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">Eu,
em minha ignorância de gnomo de jardim, sei que o bilhete em suas mãos foi
deixado ali há muito tempo. Mas ela, em sua magia de ser humano, acredita
fielmente que é um recado de Victor.<o:p></o:p></span></div>
<br />
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif"; font-size: 12.0pt; line-height: 200%;">“Ainda
te olho todos os dias daqui de cima, com o mesmo amor que sempre tive por
você.”<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="line-height: 200%; text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-d618r9yZNLs/VThmKGIRdLI/AAAAAAAANy0/xbRW1PZ_AR8/s1600/114452225-1024x537.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; line-height: normal; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em; text-align: center; text-indent: 0px;"><img border="0" height="166" src="https://4.bp.blogspot.com/-d618r9yZNLs/VThmKGIRdLI/AAAAAAAANy0/xbRW1PZ_AR8/s1600/114452225-1024x537.jpg" width="320" /></a></div>
Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com24tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-44306778253697364452015-04-15T23:12:00.001-03:002016-01-15T23:06:47.828-03:00A nefasta sociedade das gramas verdes<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://3.bp.blogspot.com/-NZRrJfOEmjg/VS8aSS4x3EI/AAAAAAAANwA/4XKpmzsqvUE/s1600/casa_de_festa_em_varginha_grama.png" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="http://3.bp.blogspot.com/-NZRrJfOEmjg/VS8aSS4x3EI/AAAAAAAANwA/4XKpmzsqvUE/s1600/casa_de_festa_em_varginha_grama.png" height="92" width="400" /></a></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Pode ser que
seja fácil, mas não pode ser difícil, que você, caro leitor, seja capaz de
imaginar a seguinte situação: Eis que está num almoço de família e sua avó reclama
constantemente das dores na coluna causadas pela velhice. É engraçado observar
como seu pai parece não dar ouvidos, apenas balançando a cabeça e erguendo as
sobrancelhas, como se não suportasse mais ouvir a mesma balela de sempre
enquanto ingere a garfada de macarronada. Curiosamente, tal semblante é o mesmo
que o seu quando ele lhe enche o saco dizendo que “quando crescer, verá o que
são responsabilidades”.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A questão é essa.
Estão todos sempre reclamando de tudo. E se é verdade que os mais velhos sabem
mais do que os mais jovens,deverá ser então um fato que a tendência da vida é
sempre inevitavelmente piorar.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Mas será
mesmo? A vida é mesmo assim tão cheia de desastres e catástrofes depressivas?
Estamos todos condenados a infelicidade? Essas e outras perguntas, você não
verá respondidas sexta no Globo Repórter. Afinal, não são coisas sobre as quais
seres humanos se dão ao trabalho de dizer.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> E foi por isso que deixei de discutir com
humanos e dei ouvidos a Chubble, discutindo tal tema enquanto jogávamos eu e
ele nossa partida matinal de xadrez no despertar de terça feira. Como de
costume, reclamávamos da vida. O trabalho está cansativo, a faculdade está
puxada, e garotas tolas da internet insistem em dizer que E. L. James é uma boa
escritora. Mas por mais que reclamemos com afoitamento, tal feito não é pra ser
feito em voz alta.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Afinal, todos
fingem já estar cientes de que a vida é uma droga sem fim. Motivo pelo qual
temos todos a resposta na ponta da língua quando nos indagam “Como está você?”.
Se a opção de se limitar ao simples “Estou bem, e você?” não for a escolhida,
brota do diálogo uma veemente competição, na qual o oponente se esforça ao
máximo para provar que a vida dele tem sido a mais difícil. Diga que está
trabalhando muito, e dirão que estão trabalhando mais. Diga que os filhos dão
trabalho, e dirão que o trabalho lhes deu filhos. E o consenso dos maiores se
comunica... de que a vida inteira é uma completa desgraça.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Mas desprovido de graça era mesmo o
maldito Senhor Laerte. O vizinho que ladeava o terreno da casa de férias de
Chubble, durante os meses em que se despediu de mim por um breve hiatus e foi
visitar a cidade de Gramado. Senhor Laerte era um homem robusto que plantava
grama todos os dias. Plantava-as e depois cortava, colocando montes das mesmas
em saquinhos plásticos e pondo-os sobre balanças de cozinhas, na intenção de
medir quantos gramas pesavam as gramas de Gramado. Após ter todas as embalagens
devidamente lacradas, vendia-as para toda a vizinhança. Era prova de estilo
maior no bairro comprar os saquinhos aromáticos de mato do Senhor Laerte, os
quais eram pendurados nas portas e janelas, para que a casa desfrutasse sempre
de um agradável cheiro de grama recém-cortada.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">O único vizinho que jamais comprava do
estoque de gramas era Chubble, pois tinha uma grave alergia a capim, assim como
a creme de alho pastoso.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Na tentativa de ampliar as vendas, Sr.
Laerte advertiu que Chubble muito se arrependeria se não viesse a comprar
nenhum dos pacotes aromáticos. Dizia ele que semanalmente o caminhão de porcos
que por ali passava deixava um cheiro ofensivo de excrementos pelo caminho. Tal
odor intoxicava as narinas e lacrimejava os olhos, e só podia ser disfarçado
pelo aroma das gramas penduradas pela casa. Sendo assim, comprar alguns gramas
da grama de Gramado era não apenas uma tendência estilosa, mas uma necessidade
extrema para uma vida pródiga.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Entretanto, por mais que o robusto
vizinho bigodudo tanto lhe avisasse, meu amigo-talvez-uma-morsa nunca lhe deu
ouvidos. Permaneceu unindo suas economias, moeda por moeda. Até chegar o dia em
que o caminhão de porcos passou.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">O odor das fezes dos barulhentos
animais alastrou as casas vizinhas numa temível nuvem invasora. Donas de casa
penduraram dezenas dos saquinhos de grama em suas janelas, enquanto crianças,
cachorros e corretores de imóveis canhotos corriam para suas casas, na intenção
de se proteger do temível fedor.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Chubble, por sua vez, simplesmente não
se importou. Manteve-se inerte no sofá de sua casa, frente a TV, assistindo as
reprises de Jeannie é um Gênio. É claro
que suas narinas sentiram de imediato o cheiro dos excrementos suínos no
momento em que o caminhão passou. O cheiro era, de fato, repugnante. Mas nada
que fosse impossível de aguentar. A história de Sr. Laerte era de fato um
exagero.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Assim, Chubble gastou a quantia
economizada na compra de queijo gorgonzola, pois sabia fielmente que a grama do
vizinho podia ser mais verde, mas seu queijo, ainda que com cheiro de porco,
era bem mais saboroso.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">E foi de tal história que surgiu-me a
revolta. Afinal, por que é que estão todos... Todos cultivando sacolas de grama?!
Tudo com o único intuito de mostrar para os vizinhos o quanto sua sacola é mais
difícil de carregar.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Vejam só... no topo da linha da vida,
temos as reclamações dos idosos. Sempre aptos a declarar para os mais jovens
que a terceira idade é depressivamente dolorida, e que quando alcançarem tal
idade terão vidas monótonas, dependentes de bingos, Viagra e crochê.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Como que para dar o troco, adultos voltam-se
para os mais jovens e estendem um catálogo de reclamações acerca de suas
responsabilidades. Contam sempre sobre o fardo de criar uma família, lidar com
um emprego e pagar o 10% em churrascarias. E, claro, nunca se esquecem de
dizer... “Vocês vão ver quando crescerem. Tudo será muito pior.”<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Mas não são poupados os jovens, que
ainda que aturem os adultos, reclamam tanto quanto os mesmos. Se não da falta
de dinheiro, da falta de álcool nas festas, e da falta de moedas para os Xerox da
faculdade. Apontam os dedos nos focinhos de seus irmãos adolescentes e
prenunciam que, quando estes crescerem, a vida será muito difícil.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">E até mesmo os tais aborrescentes, na
flor da idade, voltam-se para as crianças e anunciam que a vida é uma droga.
Que ao crescerem, não serão ouvidos por ninguém, taxados de rebeldes e
reclamões, e forçados a recorrer ao uso de identidades falsas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Restam então as crianças, que não tem
a quem, nem o que reclamar. Pois para elas, a vida é perfeita. Pelo menos,
ainda é. Até o momento em que os mais velhos, que acreditam ser mais sábios,
prenunciem que um dia tudo há de piorar. E ali jazem elas... na base da cadeia
alimentar. Onde a grama ainda é tão verde e divinamente fresca. Por que
insistimos em estragá-la com toda nossa porcalheira?<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Porque vivemos com o desejo de atacar
a grama alheia, assim como alguém mais velho um dia depredou a nossa. E neste
ciclo sem fim, nos tornamos realmente uma desgraça.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A vida não é ruim. A vida não é
difícil. A vida, assim como o cheiro dos porcos, não é algo impossível de
lidar.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Idosos possuem tempo para explorar os
prazeres da serenidade. Adultos possuem a independência de tomar próprias
decisões. Jovens possuem a experiência de poder cometer erros. E quanto aos
adolescentes, um turbilhão de ideias em suas mentes, para engatar projetos que
mudarão o mundo futuro.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Pois eis então a verdade. Os níveis da
vida não vão subindo de dificuldade. São os seres humanos que vão aumentando de
chatice.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">E quando vemos, somos nós que estamos
lá, perguntando aos nossos sobrinhos sobre as namoradinhas.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">E ninguém pensa que seria mais fácil
simplesmente aceitar o fato de que a vida é sim um mar de rosas. De que tudo,
exatamente tudo, está as mil maravilhas. E que os defeitos não vem de fora, mas
de dentro. Dessa estúpida mania de enxergar sempre o pior.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Pois é claro que, assim como somos
humanos, somos como grama... exatamente como a grama vendida por Senhor Laerte.
Programados desde o princípio para enfrentar o depressivo e imaginário cheiro
de merda da vida.<o:p></o:p></span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span>
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<br /></div>
Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com12tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-11048564398717367712015-04-08T19:54:00.001-03:002016-01-24T12:38:44.756-03:00Do Sorriso de Soraia<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-hTzb9t07pAM/VSWw4c6H-yI/AAAAAAAANpI/ocRRkh9JsZI/s1600/Machovka_black_woman_with_green_eyes.png" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="http://4.bp.blogspot.com/-hTzb9t07pAM/VSWw4c6H-yI/AAAAAAAANpI/ocRRkh9JsZI/s1600/Machovka_black_woman_with_green_eyes.png" height="320" width="253" /></a><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">É bem provável
que digam os anjos que a chuva tinha cheiro de chocolate suíço no dia em que
Soraia nasceu. Embora Chubble insista amargamente que não há mesmo maior
revelia num derivado de cacau europeu do que numa boa tapioca brasileira. De
qualquer forma... o cheiro era devanestador. Neologismo que aqui significa
“aquilo que devanesta”.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">O fato é que
Soraia nasceu.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">E como todo
aquele que nasce, a garota cresceu.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">E como toda
garota que cresce, a jovem tornou-se mulher.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Sim. Mulher,
com seios, TPM e sexto sentido. A pele morena, a cada ano mais escura, em
contraste com os dourados cabelos, a cada dia mais tingidos. Trazia-lhe admiradores,
assim como lhe traziam filhos.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Durante sua
trajetória, engravidou cinco vezes de cinco distintos fornecedores de esperma.
Dos filhos, três garotos e duas mulheres. Uma definitiva prole ideal para
servir de combustível... este tal que acendia a centelha que ela precisava para
alastrar sua maternidade.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Ser mãe. Esta
era a vocação de Soraia.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Se havia algo
que nenhum alguém jamais poderia negar era o incondicional afeto e preocupação
que a mulher tinha por seus filhos. Não
apenas pelos cinco filhos legítimos que trouxera do ventre. Mas também qualquer
reles e palpável necessitado que batesse a sua porta, janela ou panturrilha em
busca de ajuda. Soraia considerava qualquer amigo ou conhecido como filho, e
vivia seus dias cotidianamente prestando ajuda ao primeiro grito de socorro.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Foi tal
vocação maternal que a levou a criar a distinta Escola Especializada Em
Escoteirismo. Um belíssimo local que captava indivíduos infantis das favelas,
ruas, praças e condomínios fechados, e os robotizava para uma vida fartamente
recheada de valores e boas ações, instaurando um amor incondicional pelo lema
“O próximo antes de mim”.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Os garotos e
garotas escoteiros foram muitos. Passaram-se anos, e novas turmas surgiram, à
medida que as seguintes subiam de nível, até alcançar a graduação. Os
“Escoteiros de Soraia” tornaram-se conhecidos, por toda a cidade... por todo o
estado... por todo o país. Salvavam crianças em árvores, e gatos perdidos em
shoppings e supermercados. Faziam homenagens públicas a espécies silvestres da
fauna, e capturavam políticos para mantê-los em cativeiro.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A franquia das
Escolas Especializadas Em Escoteirismo se multiplicou em cinco distintas sedes
por todo o território nacional. Cada um dos colégios se tornou responsabilidade
de um dos filhos legítimos de Soraia.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">O primeiro foi
dado à Catarina, que aceitou-o de bom grado, sempre certa de que merecia as
melhores regalias por ser a mais velha dos irmãos.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">O segundo foi
para Pedro, que, sempre cismado em discordar de tudo o que a irmã fazia, logo
tomou uma das vagas para si, para provar que podia fazer um melhor serviço.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">O terceiro
irmão, Jeremias, logo viu na oportunidade uma forma de aumentar sua
popularidade, descolando também alguns fundos para uma futura aquisição de um
Xbox, e assumiu a direção de uma das franquias.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A quarta
escola, ficou sob os comandos de Esther, a penúltima irmã, que de tão estudiosa
e aplicada em suas pesquisas místicas, chegava a ser perturbada e lunática.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A última e,
sim, menos importante... foi designada para os domínios de Evandro. O caçula da
estirpe, com quem Soraia raramente tinha contato.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">E assim se
estabeleceram os negócios de família.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Mas nem só de
pão viverá o homem. E nem só de amores vivia Soraia. Os anos na política se
transfiguraram para um governo opressor, que abusava do poder e destoava
daqueles que acreditavam em justiça. Condenada por propagar ideologias de alta
periculosidade, Soraia foi mandada para o exílio. Expulsa para uma ilha
longínqua, condenada a nunca mais voltar.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Contudo, os
recados que deixara na geladeira para os cinco filhos afirmavam com toda a
certeza que um dia ela voltaria, e que cada um deles deveria preservar o seu
legado até que o momento chegasse.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Dessa forma,
cada um passou a guiar sua Escola Especializada Em Escoteirismo à suas próprias
maneiras.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Catarina, a
mais velha, prometeu que, de todas as formas, manteria viva a imagem da mãe.
Com uma extrema afeição por fotos, mandou emoldurar centenas de quadros com os
semblantes afetuosos de Soraia, e espalhou-os por todos os cantos. As imagens serviam
de lembrança. Um carinhoso cutucão na memória que permitia aos escoteiros
mirins sentirem a matriarca sempre por perto.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Contudo,
buscava uma maneira de ir em busca da mãe. Sem tê-la por perto, buscou ajuda
dos seus seguidores. Os demais Escoteiros já graduados que haviam vivido em seu
propósito, e que sabiam de cor todos os ensinamentos, desde o Manual de Cozinha
à Base de Queijo, ao Guia de Sobrevivência Na Sessão de Nicholas Sparks. Cada
um daqueles grandes nomes conhecidos trazia para a escola de Catarina
ensinamentos inigualáveis, fazendo com que todos se sentissem mais próximos da
mesma distante Soraia.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Pedro, por sua vez, recusou-se a pedir
ajuda de tais profissionais. Acreditava que a sabedoria de Soraia era tão
magnificamente perfeita, que ninguém a ela podia se equiparar. Contudo, era
sabido que sua mãe havia sido, além de matriarca, e atriz substituta na versão
municipal de O Mágico de Oz, uma excelente escritora. Deixara para trás textos
e escrituras recheados de seus princípios e ensinamentos.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Assim, para que não houvesse erros ou
mirabolações, a escola de Pedro usou os livros. Os alunos eram didaticamente
educados todos os dias, estimulados a ler textos e mais textos de Soraia que
lhes ensinavam belamente. As turmas foram muitas, e os estudantes cada vez mais
capacitados tornaram-se exímios conhecedores dos livros de escoteirismo. Com o
tempo, a Escola Especializada Em Escoteirismo de Pedro abriu turmas para o
ensino básico, assim como classes para pós-graduação. E a educação tornou-se
entre eles primazia.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Pedro, entretanto, jamais deixou de
buscar pela mãe. Sabia enfim que não havia melhor meio de aproximá-lo de Soraia
do que ler suas belíssimas palavras. E vivenciando seus textos cotidianamente,
ao lado de um pacote de Doritos diário que alimentava seu vício incessante por
salgadinhos, o segundo filho seguiu a vida mantendo a esperança no retorno da mulher.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Jeremias, por sua vez, teve medo de
deixar que cada estudante interpretasse os livros de Soraia por conta própria.
A receita de Bolo de Papo de Anjo contida no Livro dos Segredos Culinários, por
exemplo, era tão complexa que, se mal interpretada, poderia resultar no
nascimento de um vírus capaz de causar um verdadeiro apocalipse. Decidiu então
que caberia a ele interpretar as palavras da mãe e ensinar aos alunos o que
cada sílaba significava. Decidido a manter viva a imagem de Soraia, gastou anos
contando aos Escoteiros sobre a pessoa maravilhosa que esta fora e ainda era.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Não pôde, é claro, deixar de tentar
buscá-la de alguma forma. Sabia o quanto a mãe era adepta de popularidade.
Assim, decidiu divulgar seu nome de todas as formas, disposto a fazer que o mundo
todo soubesse quem ela era. Uniu grupos de estudantes e saiu pelas ruas,
batendo de porta em porta, contando a todos sobre Soraia e os valores
maravilhosos que ela propagava. As pessoas se encantavam com tudo o que
Jeremias espalhava, e logo o nome da matriarca dos Escoteiros tornou-se
conhecido e estampado em outdoors, programas de auditório, e adesivos de
para-choque.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Já a jovem e ametodicamente ousada
Esther, decidiu ir além do proposto pelos irmãos mais velhos, e buscou um meio
de haver um real contato com Soraia. Era sabido que os sinais de telefone e
conversas por Skype não funcionavam no território exilado, mas foi com muita
pesquisa e testes duvidosos em rádios abandonadas e depósitos radioativos que a
mulher conseguiu uma maneira. Desenvolveu um método de captação de mensagens
através de antenas parabólicas, no qual sussurros eram jogados em sua mente
através de ondas magnéticas, permitindo-a contatar indivíduos da Ilha do Exílio.
As antenas jamais se conectaram diretamente a sua mãe, mas contatavam vez ou
outra alguns exilados que viviam com ela e lhe transmitiam suas mensagens.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Sem nunca deixar as pesquisas com as
antenas comunicativas de lado, Esther passou a divulgar as mensagens dos amigos
de sua mãe, ensinando aos alunos valores sobra a bondade e a caridade. O
sistema da Escola, organizado em níveis, apenas permitia que o aluno
prosseguisse para uma nova etapa se ele realmente demonstrasse bons feitos na
trajetória.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Pois então...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Que uma relação entre quatro irmãos
que desde a infância não fora pacífica, logo tornou-se alimentada por um
espírito competitivo de quem seria o melhor Escoteiro-Mór. Cada um passou os
anos seguintes na tentativa de provar que, quando a mãe enfim retornasse,
dentre todas as Escolas, da sua ela mais se orgulharia.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Distante então de Catarina, Pedro,
Jeremias e Esther, o caçula Evandro cuidava também da Escola da qual ficara
encarregado.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Ao contrário dos irmãos, jamais buscou
por Soraia. Nunca havia chegado a criar nenhum vínculo afetivo pela mãe sempre
atarefada.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Assim, por mais que cuidasse do legado
que ela lhe deixara, jamais se importou em pensar na figura da matriarca, e,
principalmente, em momento algum acreditara que ela algum dia retornaria do
exílio.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Por mais que não pensasse nela...
pensava em seus alunos. Esboçava um apreço e afeto imenso por cada um daqueles
pequenos jovens em sua Escola, e voltou os olhos para a receita que os tais
tanto almejavam: bandejas de educação com sérias pitadas de carinho.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Ajudou não apenas na formação de seus
Escoteiros, mas lutou por direitos dos idosos em protestos na prefeitura,
realizou campanhas de agasalhos e brinquedos novos para famílias da região,
contratou engenheiros que esboçassem um devido projeto de saneamento para os
bairros necessitados, construiu uma rede gratuita de oficinas de arte e esporte
para crianças e adolescentes, enquanto distribuía semanalmente dez mil caixas
de pizza de franbacon para todos da comunidade.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Viveu sua vida em prol de sorrisos...
Sorrisos das faces de seus alunos, de seus amigos, de conhecidos, e de
desconhecidos também.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Por mais que houvesse se esquecido da
mãe, jamais se esquecera dos irmãos. Enquanto os demais perpetuavam em brigas e
discussões tolas numa competição de quem dirigia a melhor Escola, Evandro se
dispôs a ajudar cada um da melhor maneira que pôde. Ajudou Catarina a contatar
professores de outras escolas para lhe prestar auxílio. Contribuiu com as
pesquisas de Pedro lhe fornecendo livros de sua biblioteca privada. Fez
empréstimos financeiros para que Jeremias pudesse investir na divulgação de seu
trabalho. E selecionou alguns de seus melhores Escoteiros para ajudar na
construção das antenas parabólicas de Esther.<span style="color: red;"><o:p></o:p></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">E foi neste cair das pétalas que anos
se passaram.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">As Escolas dos quatro irmãos mais
velhos seguiam os passos de Soraia, enquanto a escola de Evandro seguia os
passos que se mostravam necessários.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Eis então que uma grave epidemia
adoentou os corruptos no poder. Logo, ditadores morreram em massa, e o país voltou
ao período democrático. Num dia de inverno, tipicamente sem neve, onde cada
exilado teve a chance irrecusável (ou não) de voltar para casa, Soraia retornou.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A multidão foi à loucura. Pessoas,
animais e palhaços foram às ruas para festejar a volta daquela que fundara as
tão respeitadas e essenciais Escolas Especializadas Em Escoteirismo.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A felicidade de ninguém, contudo,
podia ser maior do que aquela que alastrava os filhos da mulher.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Catarina, Pedro, Jeremias e Esther
vestiram seus melhores pares de roupa, com sapatos combinando e sorrisos
polidamente carismáticos. Não viam a hora de mostrar para Soraia tudo aquilo
que haviam construído em sua ausência. Os quadros e bustos em sua homenagem, as
pesquisas fundadas em seus livros, a publicidade em torno de seu nome, e os
projetos de caridade feitos conforme ela bem ensinara.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Soraia nunca se sentiu tão amada. Os
quatro filhos mais velhos lhe haviam provado jamais terem se esquecido de seu
nome.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Mas foi no encontro do último filho
que instaurou-se a surpresa real. Envergonhado, Evandro arrependia-se de todas
as formas de ter duvidado da própria mãe. De ter perdido as esperanças.
Desconsolado, pedia em murmúrios que ela o perdoasse.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Mas não foi o que fez Soraia. A
matriarca enxergou na Escola de Evandro tudo aquilo que sempre pregara. Em cada
ato e detalhe singelamente realizado, recendia a mensagem de seu lema
principal: “O próximo antes de mim”.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Seus irmãos
passaram a vida cuidando com amor dos Escoteiros deles, na intenção de me
agradar. – ponderou a mãe - Tu passaste o mesmo período cuidando dos teus, na
simples intenção de que seus Escoteiros se sentissem amados, e aprendessem a
amar também.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Foram estas
palavras que lhe deixara antes de dar as costas e partir em férias prolongadas
para a Escandinávia. Mas para Evandro, que sempre vivera em prol de sorrisos, o
sorriso dela era tudo. Tudo para deixar claro o que se passava na mente sinuosa
da negra mulher de cabelos tingidos.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Soraia jamais
quisera ser amada. Quisera ela, na verdade, que o mundo fosse amado por seus
filhos.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Das homenagens
de Catarina, da esperança de Pedro, da dedicação de Jeremias e do carinho de
Esther... obtivera amor.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Mas, naquele
dia, apenas da pura e despretensiosa entrega árdua de Evandro obtivera orgulho.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Pois lhe
mostrando que amava o mundo, lhe mostrava que amava o lema, e lhe mostrando que
amava o lema, Evandro acabava mostrando que, mais do que todos outros, amava
Soraia acima de todas as coisas.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span></div>
<o:p></o:p>Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-68166484884603293732014-08-20T11:46:00.001-03:002016-01-24T12:38:51.696-03:00De contações e anéis<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> “Há
muitos e muitos anos, nas emaranhadas e úmidas terras de um bosque mais que
distante, vivia um peculiar espécime de elfo travesso. Com olhos esverdeados
tal qual a cor de seu gorro arrebitado, e um ossinho peculiar num dos ombros
tão pontudo quanto as orelhas que despontavam dentre os cabelos castanhos
bagunçados, passava incontáveis horas do dia fazendo teatro e poesia para os
amigos da floresta.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Sabendo que a
arte era talvez a magia mais poderosa de todas, apático o elfo se tornou no dia
em que foi capturado, e levado em jaula numa carruagem de primeira chamada para
um castelo de muros tão altos e rígidos quanto as normas que eram ditadas por
quem lá vivia. Um castelo que, contra sua vontade, se tornou seu mais novo lar.
As paredes cinzas e sem graça do deplorável local o causavam ânsia diariamente.
E os humanos que pelos corredores rodeavam geravam no pobre elfo medo e talvez
até um pouco de decepção.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Mas foi então
que, num belo dia, o elfo conheceu uma bela condessa, de personalidade forte e
pupilas acastanhadas de olhar tão forte quanto tal. A condessa enxergou no elfo
algo que poucos enxergariam num ser tão paranormalmente bizarro. Viu em seu
jeito desengonçado e em seus devaneios curiosos que ele possuía a incrível
habilidade de declamar contações. E tão esperta a sábia condessa o admirou que
logo tornou-se fiel amiga, e junto a um grupo de outros súditos fiéis, pintou
as paredes de uma das salas do castelo, e fez com que o elfo aprendesse a acreditar em sua própria
magia. Magia esta com a qual contava histórias todos os dias, para as crianças
da plebe.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">O elfo e a
condessa se tornaram artistas. Artistas num castelo cor de cinza. Mas bem mais
do que isso, se tornaram amigos. E bem mais do que isso poderiam ser... Mas o
elfo sempre um tanto bobo e com receio, acreditava que a condessa era-lhe muito
diferente, e que mesmo que fosse sua amiga, somente uma flor de pólen alvejado
pelo cupido seria capaz de fazer despertar nela algo mais forte do que amizade.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Mas tal flor
só existia num reino distante... numa plantação de lírios onde vivia um humilde
espantalho, cansado de sua vida pacata. Como que sempre ansioso para que algo
fantástico em sua vida acontecesse, ainda que há muito tempo tivesse perdido a
esperança.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Foi então que
vinda dos deuses, emergiu entre a colheita uma belíssima criatura, envolta num
manto negro que descia em sinuosas curvas pelo corpo e escondia em boa parte
seu rosto, deixando à mostra lábios rosados de arredondado contorno, que
formavam em uníssono uma silhueta de coração. Era uma Parca. Um ser místico
enviado do Olimpo na intenção de em seu destino interferir. Ergueu ao
espantalho uma das mãos e fez-lhe um convite para uma viagem fatídica em
direção às terras do Sul.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Partiram os
dois rumo ao desconhecido numa pomposa e cumprida carruagem, a qual portava em
suas laterais o brasão de uma destemida águia. Ao longo do caminho, a Parca
contava ao espantalho sobre a fatídica arte dos sonhos, sobre medos e
desilusões, sobre alegrias e fantasticidades reservadas pelo destino. O
espantalho, a cada dia da viagem, se tornava mais íntimo da misteriosa
criatura, e mais fascinado pelo seu modo sorridente, carinhoso, confiante e
principalmente... impulsivo de ser.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Quando
chegaram ao seu destino, desembarcaram numa ilha de ares tão reviravoltos que tudo
por ali parecia fora do comum. Os habitantes do local possuíam bizarros
costumes, somados a uma peculiar e insistente mania de acreditar numa tal
mágica oculta que existia naquelas terras. Haviam lendas que contavam sobre
passeios à barcos misteriosos que uniam casais impensáveis em trajetos ao pôr
do sol. Assim como rituais realizados por jovens nos quais se pingava álcool
nos ouvidos de garotas que lhes chamassem a atenção. O clima bipolar da ilha,
ora de bem, ora de mal, era tão inconstante e impulsivo que gerava até
alucinações. Em tardes ensolaradas, habitantes chegavam a relatar que viam a
Virgem Maria passeando de braços dados com o Diabo pela calçada.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Pois
então que tantas histórias e peculiaridades traziam até a ilha os mais
longínquos visitantes. E eis que enquanto a parca e o espantalho se fugiam em
tardes escondidas entre abraços e mordidas, de uma outra longa estrada vinha
mancando um míope viajante. Um lavrador quase cego, em busca de uma lenda
antiga que há tempos ouvira numa canção sobre um pequeno castelo nosso.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Caminhando
pelo mercado, em busca de orientação, foi imediatamente atraído ao ouvir o mais
belo dos sons do reino. Suas pupilas se arregalaram de súbito no momento em que
a tal intensa, serena e belíssima voz soou em seus ouvidos, num doce cantarolar
de uma música desconhecida, que recitava em versos promessas sobre nunca
desistir. Procurou por aquela voz fantástica, até encontrar sua dona numa das
tendas da vila.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Era
uma belíssima artesã, de feições graciosas e maçãs do rosto num leve formato
arredondado que chegavam a formar simpáticas e airosas pseudo-bochechas.
Cantava durante as tardes, erguendo a voz em tons graves e agudos, e encantando
a todos os viajantes com seu timbre inigualável.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Fascinado por
aquela voz, o míope se aproximou com certo receio. A sábia artesã, contudo,
tirou de dentro dele toda a sua insegurança. Simpatizou-se pelo viajante e delo
logo se aproximou. Ensinou-o a enxergar com algo mais profundo do que os olhos.
Disse-lhe como era possível enxergar com o coração.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Guiou o quase
cego pelas ruas e vielas da abstrusa cidade, ensinando-lhe a esplêndida
capacidade de confiar em alguém. De tavernas que serviam massas
cupim-alhenosas, à banquinhos de pedra escondidos entre árvores que se isolavam
do resto do mundo, passando por estacionamentos onde uma afável carruagem negra
os servia de refúgio, e até uma pequena vila onde havia quartos de luxo dentro
dos quais as horas passavam mais rápido do que o normal. Juntos, passaram
horas, dias e semanas que se desenrolaram num misto de afeto e paixão.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A artesã de
bela voz ensinou ao míope que podia muito bem enxergar a vida de forma
confiante. Talvez o mais importante... ensinou-o a ter fé em seus sonhos. E
findou os dias de passeio, dando-lhe de presente um óculos de cobre com lentes
mágicas, que o permitiam enxergar as coisas como são de verdade. O não mais
míope viajante não dispunha de dinheiro para dar-lhe em troca, mas ainda assim
fez questão de pagar-lhe em retribuição. Deu a ela um singelo anel, que
dispunha de uma pedra no topo, em formato exato de coração.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Naquele
singelo ato, a magia que o viajante tanto procurava enfim despertou-se nas
terras nefastas do reino curioso. O segredo oculto em feitiços previa que no
dia em que o mais puro dos amores conquistasse o coração da impulsiva artesã,
todas as terras e reinos vizinhos seriam enfim visitados e conquistados pela
magia mais forte de todas.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Magia esta que
se expandiu e alcançou todos os habitantes do continente. Magia que envolveu a
sábia Parca e o espantalho, e que enfim intercedeu na vida do elfo e da
condessa. Magia que inacreditavelmente era mais forte do que a arte. Falava
mais que a poesia. Encantava mais que o teatro. Contava mais histórias do que
se podia imaginar. E resistia a qualquer amadurecência vinda do destino. Magia
esta... que era o amor.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Amor que não
brotava de feitiços. Brotava de uma entrega árdua. Nascia com tempo e crescia
com cautela, regado por confiança, carinho, companheirismo e honestidade. E por
anos todo o continente viveu em prosperidade. E ainda hoje... os descendentes
de todos os súditos, elfos, plebeus e seres místicos que lá habitam, são
diariamente invadidos por tal sentimento que estimula qualquer ingênuo a se
levantar de manhã só pra vir molhar os pés na primeira onda.”</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Ele... ele escreveu isso? – meus lábios chegam a tremular um pouco ao terminar
de ler o texto e indagar à professora a minha frente.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Sim. – profere a rígida Dona Marta com o semblante fechado – Seu filho
novamente voltou a desobedecer as orientações disciplinares, e escreveu mais um
bizarro conto lúdico no lugar da redação. Eu pedi para as crianças uma
dissertação que debatesse sobre a importância das relações de afeto familiares.
E ele me veio com isso aí.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Ao
meu lado, as mãos de minha esposa apertam meus dedos de leve, e noto que ela
tenta com incerteza explicar a situação:</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Dona Marta, nós já conversamos com ele sobre isso...</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Seu filho não leva os estudos a sério! Tudo para ele não passa de uma tola
brincadeira sem sentido! Vive com a cabeça nas nuvens. Não obedece às
atividades propostas. Já tentamos de tudo com ele... mas ele insiste em não se
encaixar nos parâmetros.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Minha
mulher fita meus olhos de relance. Há tempos que somos chamados na escola para
ouvir reclamações de atitudes insensatas e impulsivas vindas de nosso garoto de
dez anos. A redação escrita por ele, redigida nas folhas que Dona Marta há
pouco colocou em minhas mãos, parece ter sido a gota d’água para a professora
impaciente.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Não se preocupe. – é o que posso dizer à severa mulher – Nós vamos ter uma
conversa séria com ele.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Onde ele está? – pergunta minha esposa.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Tive que dar-lhe uma advertência por indisciplina, e pedi que a professora da
turma de alunos de reforço o mantivesse na sala enquanto me reunia com os
senhores.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Se isso é tudo o que tem pra nos dizer... – ela se levanta e puxa meu braço
esquerdo – vamos levá-lo pra casa agora.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> A
professora se levanta a nossa frente, e nos guia ao longo do corredor. Durante
o trajeto até a sala, noto que os lábios de minha esposa estão franzidos, e as
narinas infladas, como sempre acontece quando somos chamados até a escola e
acusados de ter um filho lunático em excesso.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Dona
Marta por fim caminha até a porta da sala da turma de reforços, e gira a
maçaneta. Me aproximo da soleira ao lado de minha mulher e espero ver meu
menino sentado num canto de braços cruzados e expressão emburrada por ter
levado uma nova advertência disciplinar.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Mas
não é isso o que vemos a nossa frente. A surpresa nos invade ao notarmos que
toda a turma de alunos da aula de reforço, assim como a suposta adulta que
seria a professora, encontra-se sentada em círculo pela sala, com os olhos
atentos à apresentação que ocorre no centro. Com um pedaço de caderno em suas
mãos, e uma cartola improvisada com jornal em sua cabeça... lá está ele.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Nosso
filho.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Com uma
facilidade de discurso incrível para um garoto de apenas dez anos, ele relata
aos colegas e à professora os últimos detalhes de alguma das histórias saídas
de sua mente:</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
E assim, a madastra e os três porcos mosqueteiros entenderam que era errado
roubar as canetas do colega. E todos do reino das lapiseiras viveram felizes
para sempre. E essa história aqui, entrou por uma porta e saiu por outra... e
quem quiser que conte outra!</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Ele
se curva em agradecimento e todos os alunos o aplaudem. Não posso deixar que um
sorriso imenso escape de meus lábios ao ver aquela cena.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
O que está acontecendo aqui? – Dona Marta interfere num tom já reprendedor.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> A
professora de reforço se levanta do meio da roda e põe-se a explicar com
rapidez.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Oh, sim, Marta! Aproveitei que ele estava aqui, e deixei que os alunos
aproveitassem uma das histórias de nosso pequeno grande contador!</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Como é? Esta aula é para reforço de gramática e estudo de linguagens! E não
para incentivar a cabeça sem limites desse garoto!</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Cabeça sem limites? – a professora recua com estranheza – Marta, o garoto é
brilhante. Ele sabe contar uma história como ninguém. Os colegas são fascinados
por ele.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Os
olhos de minha esposa vêm de encontro aos meus e sorrimos um para o outro de
forma orgulhosa.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Pai, mãe! – ele logo grita ao ver-nos do outro lado da sala e corre até nós num
abraço impulsivo.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Juntos,
abraçamos nosso garoto com a mesma intensidade, enquanto a ríspida Marta ainda
nos fita num olhar seco. É então que minha esposa logo se levanta, e faz por
fim as honras de desentalar aquilo que lhe prende a garganta.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Você viu o que aconteceu aqui, Dona Marta? Parece que as habilidades
consideradas “desvirtuadas” de meu filho conseguem prender mais a atenção dos
alunos do que as aulas ministradas pela senhora. Ou vai me dizer que alguma vez
já conseguiu reunir todas as crianças sentadas em círculo com tamanha atenção
durante uma explicação?</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Ora, essa! – a mulher rebate com arrogância - É muito fácil pro garoto prender
a atenção dos colegas colocando uma cartola de papel na cabeça e contando
histórias absurdas sobre monstros e duendes.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Pelo contrário, professora. – minha boca profere com firmeza – Não é fácil de
maneira alguma. É extremamente difícil. Criar coragem para mostrar todas as
ideias que possui guardadas em sua mente, e expressá-las através da arte...
isso é um trabalho perigoso. Pode vir a render críticas e humilhações. E muitas
vezes o pobre coitado pode acabar não sendo bem compreendido. Meu filho faz o
que faz pelo amor ao que acredita. Por isso... ele conta histórias. Histórias
que ele espera que inspirem os colegas a acreditar que a vida pode ser levada
desse modo... com paixão e confiança.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Está mesmo me dizendo isso? Acredita que a indisciplina de seu filho é uma
espécie de... método educativo?</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Minha
esposa e eu soltamos uma leve risada, como se a resposta da mulher significasse
para nós dois uma pequena piada interna.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Dona Marta, há tempos lidamos com gente como a senhora. – minha esposa infere
com firmeza – Gente que se prende a paradigmas, e se impede de enxergar as
coisas de outra maneira. Se tivesse lido com atenção à redação do meu filho,
veria que ele dissertou sobre tudo aquilo que pediu. Ele contou-lhe sobre o
requisito mais crucial para a formação de uma família. Contou-lhe sobre o amor.
Aquele tipo de amor puro e honesto vindo de um casal, que inspira outras
pessoas a viver da mesma maneira.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
A diferença é que ele escreve com paixão... do mesmo modo que o ensinamos a
viver a vida. – complemento segurando numa das mãos de meu pequeno escritor com
força – Mas não se preocupe. Você ainda tem bastante tempo pra poder aprender
com ele.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Com
sorrisos orgulhosos em nossos semblantes, minha mulher e eu seguramos lado a
lado nas mãos de nosso filho e o levamos pelo corredor em direção a saída.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Este foi um dos melhores textos que você já escreveu. – murmuro com orgulho.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Ah, pai, foi você que me contou quase todas essas histórias. – ele rebate em
passos saltitantes - O conto do elfo e da condessa, da parca e do espantalho...
eu só escrevi tudo aquilo que me conta desde pequeno.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Bom... parece que você realmente tem uma cabeça tão louca e viajada quando a do
seu pai. – minha esposa murmura em seu costumeiro sorriso apaixonado.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Sem falar nas atitudes inconstantes e impulsivas que herdou da sua mãe. –
rebato num sorriso que reflete afeto ainda maior – Pois é, parece que você
herdou nossas melhores qualidades.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Tudo bem, tudo bem... Agora, podemos ir comer pastel? – ele pede apertando o
estômago - Eu tô numa fome...</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Rimos
em conjunto e adentramos o carro no estacionamento. Peço a ela que dirija dessa
vez, pra que eu possa relembrar os velhos tempos. Antes mesmo que ela dê a partida,
o pequeno Miguel já fecha os olhos e adormece no banco de trás.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
É... parece que temos um soldado cansado hoje. – rio, enquanto ligo o aparelho
de som.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Mesmo
após tantos anos terem se passado, a voz de Jason Mraz ainda sai das caixas
acústicas cantando “<i>I won’t give up</i>”
e nos faz sorrir olhando um para o outro. Minha esposa então volta os olhos
para o trânsito enquanto dirige, e solta um suspiro que soa como um misto de
sensações satisfatórias.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Ele está se tornando um Contador de histórias incrível.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Nunca pensei que ele levasse tão a sério todas as histórias que eu lhe contava.
– murmuro numa expressão contente - Hoje ele me mostrou que se lembrava de cada
uma delas.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Ele tem pelas suas histórias o mesmo apreço que eu sempre tive. – ela me
responde com um sorriso – Sabe que pra mim você sempre foi o melhor Contador
que existe.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Ainda
hoje meus olhos são inundados por lágrimas quando vejo o modo como ela me enxerga.
Ainda hoje meu coração bate mais forte sempre que ela me enxerga pelo que sou
de verdade. Ainda hoje ela me faz confiar em mim mesmo, e amá-la mais e mais a
cada dia.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Acontece que as histórias não são somente minhas. Eu tive ajuda pra escrever
cada uma delas.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
É claro que teve... – ela brinca num sorrisinho orgulhoso – Toda história
precisa de uma princesa, não é mesmo?</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Respondo
me aproximando e dando-lhe um beijo no rosto. Ela observa o reflexo de Miguel
deitado no banco traseiro e suspira mais uma vez, antes de perguntar:</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Você acha que ele sabe?</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Não
entendo a pergunta de imediato.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Sabe... o quê?</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Você acha que ele sabe... – ela volta a dizer – que as histórias são reais... e
que <i>ele</i> é o final de todas elas?</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Demoro
alguns segundos para responder. Fito por um instante o reflexo de nosso garoto
pelo retrovisor, mas meus olhos são então direcionados ao anel que ela ainda
tem em seu dedo. O aro com a pedrinha de coração no topo, que repousa sobre o volante do carro, na pele de minha artesã.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Por
fim, esboço mais uma vez um sorriso que expressa minha extrema felicidade.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> -
Sim, meu amor... Ele sabe, com certeza.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> E sabia... que do mesmo modo que era o final de muitas histórias... ele era
também o início de muitas outras, que entravam e saíam por portas diversas, mas
preenchiam um livro de páginas fantásticas que não se findava jamais.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-XRiuas_BlEc/U_Sz9lSKZ_I/AAAAAAAAEko/zSVi23lh_2s/s1600/Capturar.PNG" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em; text-align: center;"><img border="0" src="http://2.bp.blogspot.com/-XRiuas_BlEc/U_Sz9lSKZ_I/AAAAAAAAEko/zSVi23lh_2s/s1600/Capturar.PNG" height="179" width="320" /></a></div>
</div>
Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-62157327805462939702014-02-07T10:21:00.001-03:002014-02-09T22:00:48.163-03:00Madrugas de Rosalinda<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Rosalinda era uma singela habitante de uma cidade pacata. Destinada,
assim como seus vizinhos, a vagar pela monótona rotina que a vida lhe
proporcionava. Já em torno dos setenta anos de idade, possuía cabelos
grisalhos, sempre presos num firme coque, que combinados aos óculos de lentes
grossas e ao vestido bordado, lhe davam uma aparência materna e acolhedora.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<a href="http://3.bp.blogspot.com/-SwY-PFMq1cU/UvTcvot1gWI/AAAAAAAAAak/59pvJZzSq5A/s1600/Idosa.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><img border="0" src="http://3.bp.blogspot.com/-SwY-PFMq1cU/UvTcvot1gWI/AAAAAAAAAak/59pvJZzSq5A/s1600/Idosa.jpg" height="181" width="200" /></span></a><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Nunca tivera filhos. O marido falecera antes mesmo que pudesse lhe
fornecer uma prole. Mas Rosalinda nunca deixara que tal fato a abatesse. Sem
filhos para chamar de seus, fez dos vizinhos e conhecidos próximos suas
crianças. Ajudava a todos da comunidade, exercendo trabalhos voluntários,
cozinhando em festas de caridade, e sempre disposta a fornecer ajuda a qualquer
um que precisasse de socorro. Ao passar pela rua todas as manhãs, a velha
senhora recebia sorrisos e abraços de todos os cidadãos. Não havia ninguém que
não a conhecesse e não a admirasse por sua bondade e fraterna simpatia.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Cozinhava seus bolos e tortas durante as manhãs, tricotava durante as
tardes, e festava no intranquilo centro de idosos todas as noites com afáveis
companheiros. Cozinhar, tricotar, bailar e prestar ajuda a quem precisasse. Tal
rotina rodeava a vida de Rosalinda, a qual todos bem conheciam e tanto
admiravam.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Mas disse um sábio amigo em formato de morsa certa vez que seres
humanos são itens complexos, que não devem ser julgados por aquilo que fazem
durante o dia, mas sim por aquilo que fazem nas madrugadas. Um indivíduo que se
limita ao singelo ato de dormir, por exemplo, prova nada mais ser do que um
reles idiota. Um indivíduo que se arreganha à fatídica arte de sonhar já
demonstra certa aptidão para realizações, embora preguiça de levantar-se e
realizá-las bem acordado. Um indivíduo que passa a noite sobre o efeito de
álcool e drogas... é um bêbado drogado. Mas essa história não é sobre você,
sobre seu irmão caçula, ou sobre a polêmica Lindsay Lohan. Essa história é
sobre Rosalinda, e sobre o que ela fazia em suas madrugadas.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Mal sabiam os ingênuos cidadãos que a doce senhora mantinha um hobby em segredo. Algo que fornecia a sua vida um propósito, o qual a estimulava a
levantar-se todas as noites, e utilizar-se da insônia habitual para uma
prestativa atividade. E assim, toda noite, às exatas três e vinte e sete da
madruga, Rosalinda saía de casa com sua mochila de apetrechos para caça... e
matava pássaros.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Que singelo e suculento prazer ela sentia ao trucidar as pequenas
bestas cantantes uma a uma, enquanto dormiam inocentemente em seus ninhos
dispostos em árvores pela cidade. O som dos pios desesperados e o flutuar das
penas pelos ares respingadas de sangue lhe permitiam desfrutar de um deleite
indescritível, que a preenchia por breves segundos e lhe instigava a matar uma
quantidade de aves cada vez maior.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Em alguns mirava o estilingue, outros acertava com um bastão espinhoso,
os mais frágeis esquartejava com uma adaga rapidamente, e em locais isolados,
onde nenhum cidadão poderia ouvi-la, arriscava-se a matá-los a longa distância
com o rifle conivente. Por anos, exterminou os pássaros da cidade por
incontáveis madrugadas, permitindo que os cidadãos despertassem todas as manhãs
sem nenhum canto melódico a lhes perturbar.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Até que num belo dia, talvez não tão belo por sinal, e talvez não tão
dia visto que o fato só se deu na noite escura, uma jovem a flagrou durante o
ato. Os olhos de Rosalinda se arregalaram, e sua mente desesperou-se ao pensar
em como explicaria o fato de que assassinar belas aves a fazia feliz. A jovem,
contudo, não recuou assustada. Se aproximou e segurou as mãos da velha senhora,
retirando o rifle de seus dedos e dizendo-lhe que tudo ficaria bem.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Seu nome era Doralice. Uma garota de fibra, coragem e carbono. Uma
dessas pessoas especiais que, como citadas acima, se dispõem a fazer algo mais
produtivo durante as madrugadas do que simplesmente dormir. De olhos de um azul
celeste, cabelo castanho arenoso, e singela voz que acalmava Rosalinda em seu
pranto. A garota disse a velha que matar pássaros era um vício que adquirira
por falta de afeto. Mas que tal podia ser corrigido com sua ajuda e devida
terapia.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A partir daquele dia, em todas as mínimas madrugadas, a jovem e a velha
saíam juntas, não mais para matar pássaros, mas sim para enxergar nos pequenos
seres o doce milagre da vida. Doralice lhe explicava em sábias palavras sobre
como cada singular animal se relacionava com o ecossistema, sendo assim
importante para a natureza como um todo. Os pássaros não apenas embelezavam os
campos e ruas pela manhã, mas também cortavam céus e nuvens trazendo alegria,
alimentando seus filhos em ninhos acolhedores, e constituindo famílias formadas
de pios, afeto e penugem.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Foi após treze noites consecutivas que Doralice deu seu trabalho por
finalizado. Havia ensinado com
eficiência tudo o que sabia à pródiga idosa. Rosalinda sorriu ao ver-se livre
de seu vício, ciente de que não mais precisaria trucidar tão belas criaturinhas
para se ver feliz.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Com extrema afeição, abraçou a jovem, agradecendo-lhe por tudo o que
havia lhe ensinado.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Num sorriso mais que materno e num gesto triunfal, a velha
senhora ergueu o rifle e acertou três tiros em cheio na cabeça de Doralice. O
sangue pintou o gramado com o mais puro escarlate e refletiu o brilho da lua de
maneira poética. Rosalinda sorriu orgulhosa diante do corpo da garota.</span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Nunca mais cometeria a atrocidade de assassinar pássaros... Matar pessoas
era bem mais divertido.</span></div>
Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-43009974551177283192013-12-02T00:54:00.003-03:002016-01-24T12:38:59.586-03:00Reescrita: O eterno dilema de Shelby<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">(Texto finalizado às 1:40. Isso com certeza quer dizer alguma coisa...)</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<o:p><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span></o:p></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Sacção
cognitiva. Foi este o termo inventado por meu amigo Chubble para designar o
evento ocorrido quando duas histórias completamente diferentes são capazes de
se relacionar, e ser comparadas de tal maneira que uma torna possível a
compreensão da outra. Disse a ele que já existiam diversos termos para designar
tal evento, sendo ‘metáfora’ talvez o mais recorrente. Mas insistiu o nobre ser
que ‘sacção cognitiva’ é agora um neológico termo formalizado, e que não muito
em breve o veremos estampado em didáticos livros de português.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> E é fazendo uso de tal sacção, que vos falo do dilema
que envolve todo jovem escritor. A tão pomposa e complexa dama chamada Reescrita.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Ah, a Escrita! Tão bela e ingênua em seu primeiro
brilhar! Não há magia maior do que a presente no brilho que existe entre as
linhas que trespassam o nascimento daquela ideia... aquela ideia que esteve em
sua mente por eras... formigando para ser inscrita em papel. Quando seu texto
finalmente nasce, o orgulho paterno lhe enche da maneira mais teatral possível.
A história lentamente parte ao mundo, e você sabe que parte sua partirá junto a
ela nessa partida partidária.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<a href="http://3.bp.blogspot.com/-sqIHYV70UDQ/UpwEoW4basI/AAAAAAAAAZ4/8XnEwpu7ZiQ/s1600/reescrita.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><img border="0" height="150" src="http://3.bp.blogspot.com/-sqIHYV70UDQ/UpwEoW4basI/AAAAAAAAAZ4/8XnEwpu7ZiQ/s200/reescrita.jpg" width="200" /></span></a><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Mas não há como negar. Fazer com que um texto nasça é
peculiarmente prazeroso. Mas fazê-lo voltar ao ventre pra nascer uma segunda
vez é desgastante e enfadonho.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> “Gostei do seu texto, caro amigo que me pediu uma opinião sincera, mas
talvez você deva melhorá-lo, acrescentando mais detalhes no parágrafo onde
descreve as axilas da protagonista, e alterando o que acontece no final. Aquele
lance da explosão não se encaixou muito bem, desculpe. Tente mudá-lo.” E é com um comentário desses que tudo se
desmorona. Não bastaram os meses de gestação que você gastou numa história...
lá vem um sábio leitor e opina dizendo que você deve reescrever...</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Ah, a Reescrita! Tão necessária, mas tão
demoniacamente chata! Passar pelos locais onde já esteve, e dizer aos seus
amigos verbos e substantivos que eles não estão exercendo seu papel com
maestria, e precisam ser trocados por outros que exerçam a função de maneira
melhor. Mesmo que o autor concorde que há falhas em suas linhas, ele nunca vai
se render a ideia de que alterar suas palavras é tão divertido quanto
escrevê-las pela primeira vez. A escrita lhe serve de aspiração... é romper seus
limites e expressar sua voz. Já a Reescrita vem lhe aparar as arestas,
adequando seu texto ao que “deveria ser” e tornando-o mais aceitável... E quem
disse que devemos sempre nos render ao que é aceitável?</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> E é nessa sacção que chegamos a Shelby. A terceira e
meia garota por quem Chubble se apaixonou (o ‘meia’ é uma história para mais
tarde). Nunca entendi quais os motivos que levaram meu sábio amigo a gostar
dela, mas sei que no momento em que pôs seus não-sei-quantos olhos na garota,
sentiu uma atração que ia além de mera paixão casual. Não sabia se era o que os
humanos costumavam chamar de amor à primeira vista. Por isso, olhou para Shelby
dezessete vezes antes de ter certeza.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Talvez eu tenha esquecido de mencionar as
circunstâncias em que ocorreu tal encontro. Há tempos minha irmã fez uma curta
viagem ao Rio de Janeiro, para cuidar de negócios que envolviam raquetes e
croissants de chocolate, e sem nem mesmo saber levou nosso oculto amigo dentro
da bagagem. Ansioso por conhecer a chamada cidade maravilhosa, Chubble me
relatou que a única coisa realmente maravilhosa que encontrou fora Shelby. A
tão bela moça que encantava seus olhos, os quais apenas ele podia enxergar.
Shelby era como ele... enigmática e admiradora de queijo gorgonzola.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Por dias os dois aproveitaram a cidade, divertindo-se
em piqueniques improvisados em esquinas do lado leste e em corridas durante a
madrugada contra as gélidas correntes de ar que trespassavam um calçadão
qualquer. A história de amor entre ambos floresceu como um rápido devaneio
infantil. Tanto que, no dia em que minha irmã voltou para casa, não apenas
Chubble voltou na bagagem, como Shelby adentrou nossa casa também.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> E um lar, onde uma criatura enigmática já habitava,
duplamente estranho se tornou. Nossos olhos humanos não enxergavam Shelby, mas
qualquer um era capaz de sentir o grande espaço que ela ocupava. Talvez fosse
seu ego inflável, ou a mobília da qual não conseguia se livrar. Tudo o que sei
é que, não bastava o quanto ela me incomodasse, não pude dizer “não” quando
Chubble pediu que eu permitisse que ela se mudasse. Também não pude dizer “sim”, e foi
por isso que acabei dizendo “Aceita sanduíche de mortadela?”.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Por dias a relação entre o casal se manteve estável.
Gostavam de jogar cruzadas e de recitar poemas às quatro e quinze da manhã.
Cobiçavam comprar um cachorro e dissecá-lo para abstrair conhecimento
biológico. Juntos, sonhavam cada vez mais alto...</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Chubble nunca poderá dizer que não foi avisado. Disse
a ele para que não se entregasse completamente a paixão. Mas o ingênuo ser fatalmente fez de Shelby o centro de suas
atenções. Não sei se a garota se sentiu pressionada pelo excesso de elogios e
carinho, ou se possuía alguma séria alergia a mortadela. Tudo o que sei é que
Shelby fracassou em sua missão, e após doze dias, nove horas e trinta e sete
minutos, não pôde mais sustentar seu disfarce. A pérfida individua era uma fugitiva.
Procurada por traficar porquinhos da índia canhotos a laboratórios
clandestinos. Não sei se era ave ou mamífero, mas era com certeza um ser
traiçoeiro. Esmagou os sentimentos do pobre Chubble, e deixou nossa casa
levando todo o estoque de gorgonzola.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> E por dias meu pobre amigo desabou-se em decepção.
Não apenas os potes de sorvete, mas até mesmo os potes de feijão foram devorados durante sua extrema melancolia acompanhada
pela fome. Tratava-se da primeira grande desilusão amorosa do pequeno Chubble,
visto que nenhuma das outras duas e meia garotas de seu passado o cativara de
tal maneira.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Nos primeiros dias, desejou não apenas a morte de
Shelby, mas também que ela fosse torturada por babuínos impiedosos num método
diabólico e opressor. Após o estágio
raivoso, desejou que pudesse mudar seu passado. Que pudesse voltar no tempo, e
reviver as últimas semanas. Que tivesse percebido que havia muitas outras
coisas maravilhosas no Rio além da enigmática Shelby (dizem, por exemplo, que
há uma lata de lixo na esquina de uma das avenidas que é de uma simetria
perfeita). Que não tivesse depositado toda a sua eufórica paixão em tão pouco
tempo numa garota. Que tivesse agido de outra maneira...</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Chubble
queria reescrever o ocorrido.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Foram
necessários alguns dias serenos e um pouco de chá de seticina para que meu nobre amigo entendesse que aquilo não era o
fim. Ou talvez fosse, mas que todo fim nos abre uma porta para um novo começo.
Nem tudo o que escrevemos ao longo da vida nos agrada, mas nem por isso podemos
voltar e refazer nossas tolas ações. Erros não foram feitos para serem
consertados, e sim para prevenir os outros erros do futuro.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A história
de Shelby não é apenas ruim. É um lixo. É chata, enfadonha, e não deveria ser contada a ninguém...
Mas nem por isso Chubble deve rejeitá-la. Afinal, qual mesmo a graça da vida se
não tivermos algumas desilusões? Do mesmo modo que os textos de um escritor
nunca de destacarão se não houver
alguns textos ruins vez ou outra. Reescrever é para os tolos... os sábios
deixam sua marca no texto de baixa qualidade, e dão um passo para o próximo volume, no qual sabiamente tentarão se
superar.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A intenção
de tal texto não é contar uma história. É falar sobre a Reescrita, essa tal
jovem que tanto me atormenta. E para tal faço uso da sacção cognitiva,
mostrando que até mesmo Chubble sabe que reescrever um texto é como lembrar-se
de uma ex-namorada. Vocês podem até voltar a se dar bem, mas nada nunca será como da primeira vez.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Afinal, textos
ruins são como desilusões amorosas... por mais que você queira esquecê-los,
apagá-los ou consertá-los, você sabe que tais refletem parte de sua essência. São
parte importante de seu passado. Retratam dias em que você agiu de maneira
estúpida, mas que ainda assim agiu como bem queria. E talvez, por isso, você
não deva tentar consertá-los...</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Não sei nem se eu mesmo entendi o que
quis dizer com esse texto. Seres humanos tem certa dificuldade pra entender
certas metáforas... ou melhor... sacções cognitivas. Mas se os humanos não
compreendem, talvez para os pequenos porquinhos da índia escritores faça algum
sentido.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Nem sei se eu estava falando da Reescrita
realmente. Talvez fosse um modo que encontrei de falar sobre outra coisa. E
talvez Shelby não fosse traficante de verdade... Talvez... esse texto tenha
ficado um tanto confuso... ou talvez confuso demais... Talvez eu não devesse
tê-lo escrito...</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Ou
talvez... eu deva <b>Reescrevê-lo</b>...</span></div>
Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-56673334768265344862013-11-21T11:56:00.001-03:002013-12-03T12:06:27.331-03:00Relatos de um Sorveteiro Deleitado<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<i><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A história a seguir foi encontrada por meu
amigo Chubble, escrita numa página rasgada de um diário a mercê do lixo
hospitalar encontrado ao fundo do terreno de uma academia de artes cênicas. O
papel continha digitais engorduradas, e um leve aroma de sorvete de limão.
Contudo, Chubble insistiu que eu transferisse tais linhas para o público, na
intenção não apenas de imortalizar sua mensagem, mas também na esperança de que
algum humilde leitor conheça o significado de “tapulhice”.<o:p></o:p></span></i></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<i><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">(Os nomes do sorveteiro Rodrigues da Cunha e
do garoto Bernardo Fernandes foram retirados da história para evitar maiores
constrangimentos ou processos judiciais contra o paupérrimo escritor.)<o:p></o:p></span></i></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span></div>
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-BqijkXT5czg/Uo4e3XsLeJI/AAAAAAAAAZo/edcfl2rhi9A/s1600/sorvete1.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><img border="0" height="320" src="http://4.bp.blogspot.com/-BqijkXT5czg/Uo4e3XsLeJI/AAAAAAAAAZo/edcfl2rhi9A/s320/sorvete1.jpg" width="254" /></span></a></div>
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span>
<br />
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Deleite.
Quer palavra melhor do que essa? Que outras sílabas poderiam de forma tão
singela representar o doce momento de contato entre o paladar e tal creme
refinado? A cena intocável na qual meus clientes tão satisfatoriamente são
invadidos pelo sabor gelado do melhor sorvete do bairro. Foi tal razão que me
levara ao inscrever tais sete letras na lateral do carrinho. Quem disse que um
mero vendedor de sorvetes não pode querer se expressar de forma poética? E é
fato sabido por muitos que a palavra “Deleite” por si só soa mais poética do
que certas estrofes que encontramos pela vida.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Mas
deixemos deleites de lado, pois tal história não é sobre mim. Nem mesmo sobre
os sorvetes que há anos vendia no mesmo ponto. Ambos são só circunstâncias que
rodearam o jovem garoto. Bochechas com sardas, cachos castanhos, e língua bem
solta aos oito de idade. Seu nome... nunca soube. Mas o descrevo como ninguém
mais poderia. Pois só eu sei dos poderes que alcançou antes do fato. Só eu sei
do mais importante... que não foi o fato... mas sim o efeito... (Não se
preocupem, meus sorvetes não são tão complexos quanto o que costumo dizer por
aí.)</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Voltemos
então ao primeiro dia, no qual os olhos esverdeados me fitaram de forma
singela. Nunca gostei de crianças, mas sempre fingi adorá-las. Afinal, a maior
parte do lucro de um sorveteiro vem da remota arte usada pelos jovens chamada
“birra”.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Mas
desacompanhado jazia o jovem garoto, me fitando como se desejasse apenas com os
olhos me trucidar.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Posso
ajudá-lo? – indaguei, fazendo-o despertar do transe momentâneo.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Ah, me
desculpe... Estava pensando em qual dos sabores preciso escolher...</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Fitei-o de
sobrancelha erguida, e lhe entreguei o cardápio.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Bom, as
opções são muitas. Das mais variadas. Morango, creme, menta, chocolate... todos
refinados com uma receita especial de família...</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Não são
os sabores que importam, seu tapulho! – ele me repreendeu.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Como é...?
Tapulho?...</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Não estou
em dúvida quanto aos sabores! Tenho oito anos e sou gordinho! É claro que quero
o de chocolate! Mas o que eu quero não importa... preciso encontrar o Poder Secreto...</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Ele desviou
os olhos e voltou-se para o cardápio. Permaneci fitando-o com olhos confusos.
As razões pelas quais nunca gostei de crianças pareciam dançar a minha frente.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Você por
acaso não teria a lista dos poderes em algum lugar, teria?</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Lista
dos... garoto, eu não tenho tempo pra brincadeiras. Escolha logo o sabor que
deseja.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Ai, seu
tapulho! Não conhece nem mesmo os poderes dos sorvetes que você vende?! É a
história da sua família!</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Soltei um
suspiro pesaroso e contei até dez mentalmente, enquanto o insistente garoto
permanecia me explicando:</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- As
receitas de sorvete da sua avó têm ingredientes mágicos especiais. Cada um dos
sabores nos dá poderes diferentes, capazes de fazer coisas fantásticas
acontecerem!</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Ok,
garoto. A história é legal... mas de onde tirou essa ideia? – acabei cedendo
uma risada.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Não é só uma
história. Sua avó era uma bruxa bondosa, que enfeitiçava os sorvetes para
alegras as crianças. Minha mãe a conheceu há muitos anos, e contou tudo pra
mim.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- E posso
saber onde está sua mãe? Ela não devia deixar um garoto tão distraído sair por
aí andando sozinho...</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Você
ainda não acredita, né? Tô falando a verdade, moço! Seus sorvetes são mágicos!
Minha mãe descobriu os poderes deles quando era criança, e me trouxe aqui uma
vez quando eu era pequeno... Mas ninguém até hoje conseguiu encontrar o Poder Secreto...
e eu vou achar...</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Poder
Secreto? – rebati com indiferença - Garoto, acho que eu saberia se vendesse
esse tipo de coisa no meu carrinho.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Não se
preocupe. Estou acostumado a pessoas não acreditarem em mim. Mas vou provar pra
minha mãe que sou capaz de encontrar o Poder Secreto. Vou tomar todos os seus
sabores de sorvete, até encontrá-lo... mesmo que isso gaste todo o tempo do
mundo...</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">O pobre
jovem claramente era perturbado, mas não recusaria vender mercadoria a um
consumidor tão ávido por meus sorvetes. Foram necessários alguns minutos para
que ele por fim optasse por groselha.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Deu-me o
pagamento em moedas e partiu sem dizer coisa alguma.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Quase que
no mesmo horário, no dia seguinte, retornou com o mesmíssimo olhar penetrante.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- E então?
A groselha te deu algum poder fantástico?</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Você
ainda não acredita em mim, não é mesmo, seu tapulho? – murmurou o jovem – Bom,
infelizmente não é o Poder Secreto. Mas, assim como todos os outros, seu
sorvete de groselha tem sim um poder especial. O poder da paixão. Funciona
melhor do que poções do amor...</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Ora,
essa! – exclamei em ironia – Não vá me dizer que o sorvete lhe arranjou uma
namoradinha.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Ainda sou
muito novo pra isso, seu moço. Mas hoje na escola, durante o recreio, Bianca
Fagundes deixou que eu sentasse do lado dela e segurou nas minhas mãos durante
todo o tempo. Isso com certeza foi efeito do sorvete de groselha! É o poder da
paixão!</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">-
Magnífico. – ergui as sobrancelhas – Mas parece que não era esse o poder que
procurava.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Pois é...
vou ter que experimentar mais um... escolho o de menta.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">E o de
menta a ele entreguei. Novamente, deu-me o pagamento em moedas e partiu sem
dizer coisa alguma.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Passou-se o
dia, passou-se a noite, e no mesmo horário matinal, surgiu o garoto a minha
frente. Começava a gostar da brincadeira, e sorri ao lhe dizer:</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- E então?
Que poderes a menta lhe deu?</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Ultra
velocidade! Você não faz ideia de como é um poder bacana! Ganhei de todos os
meus colegas na aula de atletismo!</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Não me
diga... quer dizer então que finalmente encontrou o que procurava?</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- O quê?
Não! Que tapulhice! Ser veloz é divertido, mas não chega nem perto do poder que
eu realmente procuro!</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Mas
garoto... o que lhe faz pensar que esse tal Poder Secreto realmente está entre
os meus sorvetes?</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Minha mãe
disse que estaria, e ela conheceu sua avó. Ela nunca esteve errada sobre nada,
e não será a primeira vez.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Bom... se
insiste nessa ideia... qual sabor escolherá?</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Hmmm... o
de limão, por favor.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">E o de
limão a ele entreguei. Outra vez, deu-me o pagamento em moedas e partiu sem
dizer coisa alguma.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Mas eis que
em tão próxima manhã surgia novamente, disposto a comprar um novo sabor.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- E
então... o que me diz sobre o limão?</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Você não
vai acreditar! Ele me deu o Poder da Inteligência! Aprendi toda a matéria da
escola em apenas um dia, e fechei a prova de geografia! Os professores chegaram
a me elogiar!</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Ora,
essa... se eu soubesse que meus próprios sorvetes podiam me fornecer tamanha
grandeza! – a cada vez, render-me a brincadeira do garoto parecia mais
simplório e divertido – Mas e então? Era esse o poder que procurava?</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">- Ainda
não. Vou ter que experimentar mais um.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">E por dias
tal rotina foi feita da mesma maneira. Passaram-se incontáveis manhãs, nas
quais o garoto ao mesmo horário sempre surgia, contando-me sobre os poderes do
último sabor escolhido e requerendo um sorvete diferente. Não podia negar... a
cada dia, me afeiçoava pela criança. Nem mesmo me importava em entender o real
significado de “tapulho”. Cheguei a temer que ele enfim dissesse ter encontrado
o tão procurado sabor, e não mais me visitasse todas as manhãs.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Juntos, passamos por quase todo o cardápio. Cereja,
morango, chocolate, prestígio, goiaba, kiwi, flocos e até mesmo chiclete. E os
poderes que o jovem dizia adquirir eram dos mais variados tipos... Energia
Incessante, que o permitia manter-se acordado durante toda a noite. Vencedor
dos Esportes, que o fazia invencível em qualquer jogo que se arriscasse a
competir. Sorte Reluzente, na qual os pais decidiam lhe aumentar a mesada e na
rua ele encontrava moedas perdidas. E vez ou outra, façanhas ainda mais
ilógicas saíam de sua boca... ao afirmar que o de goiaba o havia feito flutuar,
e que o de chiclete permitia que ele se teletransportasse.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Mas por mais que os poderes lhe enchessem de alegria
e boas histórias a contar, o jovem afirmava sempre estar ainda em busca do
Poder Secreto, o qual, por mais que tentássemos, nunca conseguíamos acertar.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> - Os sabores de sorvete estão acabando. – adverti -
Não restam muitos no cardápio...</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> - Não se preocupe. Sinto que estamos chegando perto.
Enfim... escolho o de amêndoas.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Aquele foi o último sorvete que vendi. Jamais pude
voltar a proporcionar qualquer tipo de deleite... pois a memória desta manhã se
encontra para sempre no local mais impertinente de minhas lembranças.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Acredito que o fator que me marcou profundamente não
foi a tragédia em si. Não foi assistir os lábios do garoto se inchando com
rapidez, enquanto sua garganta se fechava. Não foi tentar inutilmente salvá-lo,
enquanto clamava por socorro até que uma ambulância aparecesse. Não foi nem
mesmo receber mais tarde a notícia do Doutor Carlos, que duramente me disse que
o pobre jovem possuía uma grave alergia a amêndoas.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> O que realmente me marcou foram as últimas palavras
que pude ouvir dos lábios da criança. Caído na calçada, o garoto teve ainda
tempo de dizer-me seus últimos devaneios, antes que sua garganta se fechasse.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> - Achei o Poder Secreto... Era esse... era esse o
Poder...</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> - Acalme-se! Acalme-se! Eu vou salvá-lo! Vai ficar
tudo bem! – eu gritava em total desespero.</span><br />
<span style="font-family: Georgia, 'Times New Roman', serif;"> - Não se preocupe. Era esse o poder que eu procurava.
O poder do sorvete de amêndoas. Aquilo que eu quero há tanto tempo... – e foi
então que seus lábios se movimentaram pela última vez – o poder de reencontrar
minha mãe.</span></div>
Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-35008655834950147562013-08-31T12:44:00.003-03:002016-02-13T15:30:23.814-03:00A Ruiva que me ca(u)sou<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif; text-indent: 35.4pt;">eram nove e meia quando olhei para
ela.</span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">que era bela, qualquer um</span></div>
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">poderia dizer.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">mas o que me atraiu, na verdade,<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">não foi seu rosto, ou seu
corpo<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">mas o jeito que virava a página<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">como se o livro fosse um amigo<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">cachos ruivos e mãos delicadas.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">de tão fascinado, fiquei</span></div>
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">de castigo.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<br /></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">e todos os dias, lá repetia.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">Sentava</span></div>
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">eu,</span></div>
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">e aguardava.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">Ansiava a chegada</span></div>
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">da ruiva<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">que nem sempre aparecia,<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">mas consumia cada reles sonho</span></div>
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">meu<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<br /></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">passaram-se meses, passaram-se anos.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">esperar se tornou rotina.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">tentei descobrir seu nome.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">até mesmo o telefone.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">teu horário não sabia<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">e me fiz então de otário<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">lhe tentando</span></div>
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">poesia,<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">mas não sabia</span></div>
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">rima com ruiva.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">e todo dia a decepção.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">se a loba não vai, o lobo não
uiva.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<br /></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">a ruiva nunca apareceu.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">mesmo por anos eu tendo esperado.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">mas o destino intercedeu,<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">um dia Judite sentou-se ao meu
lado.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">conversas, risadas, histórias e
beijos.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">foi com Judite que me casei.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">perversa, malvada, se afogue no
Tejo,<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">na imagem da ruiva eu rabisquei.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<br /></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">mas eis do tal momento, - que surpresa - no dia do casamento,<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="text-indent: 35.4pt;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">q</span></span><span style="font-family: "times new roman" , serif; text-indent: 35.4pt;">uando Judite subiu ao altar,</span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">meus olhos fitaram a quarta
fileira.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">sentada ali pra me ver casar,<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">a ruiva piscava de forma certeira.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<br /></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">não gritei, não xinguei,<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-9wOJFqyetwQ/Vodc4XO_DcI/AAAAAAAAR48/8Evg2O9P9u4/s1600/love2.gif" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em; text-align: left;"><img border="0" height="120" src="https://4.bp.blogspot.com/-9wOJFqyetwQ/Vodc4XO_DcI/AAAAAAAAR48/8Evg2O9P9u4/s320/love2.gif" width="320" /></a><span style="font-family: "times new roman" , "serif";"></span><br />
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";"><span style="font-family: "times new roman" , serif; text-indent: 35.4pt;">e nem mesmo deveria.</span></span></div>
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";"><o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">sussurrei um singelo “obrigado”.<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">se não fosse a ruiva vadia<o:p></o:p></span></div>
</div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<div style="text-align: left;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";">eu nunca teria me casado.<o:p></o:p></span><br />
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";"><br /></span>
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";"><br /></span>
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";"><br /></span></div>
</div>
Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-18525930134869269342013-08-23T00:30:00.001-03:002013-12-03T12:06:27.327-03:00A Fatigante História da Vaca Relógio<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: 'Times New Roman', serif; text-indent: 35.4pt;">Já fazem três anos, sete meses,
oito dias e treze horas que me contaram tal história. Mas acredito que no
momento em que outro alguém se puser a lê-la, já se haverá passado bem mais.
Contada dos lábios de Dona Rita, que tem por hábito mastigar folhas de hortelã
enquanto conta seus casos, tal história se inicia num dia de céu límpido e
instigante, no qual uma vaca quadrúpede de nome Solange ingeriu algo mais do
que o pasto costumeiro.</span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">O pasto que existe na história
pertencia ao Senhor Gilmar, que era fumante, e habitava a cidade de Fatiganha,
um local pacato onde há tempos não se passava trupes de circo nenhum. Solange,
a quadrúpede, havia recebido seu nome em homenagem a sogra de Gilmar, que não
era quadrúpede, mas mugia como tal. Uma vaca de expressão abatida e movimentos
cotidianos repetitivos, destinada a vagar pelo pasto e ser ordenhada todas as
manhãs pelas mãos de Olavo, o empregado prestes a se casar com Vanessa, a
atraente filha mais velha do vizinho.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-CMsiFGCXYvE/UhbWdDUTuhI/AAAAAAAAAH8/iD1M8PyYswI/s1600/tumblr_m86tghdjC71qhva17.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" height="141" src="http://4.bp.blogspot.com/-CMsiFGCXYvE/UhbWdDUTuhI/AAAAAAAAAH8/iD1M8PyYswI/s200/tumblr_m86tghdjC71qhva17.jpg" width="200" /></a><span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Foi então que no já citado dia de
céu límpido e instigante, Solange (a vaca, e não a sogra) acidentalmente
ingeriu um objeto curioso. Seus relatos afirmam que o sabor se assemelhava a
metal enferrujado, em fusão com balas de caramelo. Mas o que certamente chamou
a atenção do animal não foi o sabor, mas sim o curioso e repetitivo som que o
objeto realizava. Um sonoro e aconchegante “Tic-tac”, pertencente a um peculiar
modelo de relógio que apenas era produzido em fazendas da Indonésia.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Foi Olavo, o empregado noivo de
Vanessa, quem primeiro percebeu o som que agora era emitido do interior da
bovina. Assustado, chamou às pressas pelo patrão, Gilmar, que, como já disse,
era fumante. Ambos se fascinaram com o constante contar dos segundos que a vaca
agora chefiava. A surpresa só foi maior quando Solange emitiu um mugido
angustiante, ao meio-dia e quarenta e cinco, a hora exata em que o frango
assado por Dona Maria, a mulher de Gilmar, que ouvia músicas francesas enquanto
cozinhava, atingiu o ponto exato para degustação.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">A família de Gilmar se espantou
ao ver como a vaca sabiamente havia previsto o horário em que o frango estaria
pronto, e puseram-se a fazer diversos testes com a bovina. Entre os constantes tiques
e taques do relógio em seu estômago, Solange emitia idênticos mugidos em
diferentes momentos do dia, cada qual com o seu significado. Primeiramente,
indicou o horário exato para que Dona Maria retirasse as roupas do varal. Em seguida,
mugiu avisando que Olavo estava atrasado para o almoço com os pais de Vanessa.
Lembrou a Gilmar quando deu-se a hora de buscar os filhos na escola. Avisou a
Maria que a novela já havia começado. E por fim, mugiu indicando que era hora
para que todos fossem para a cama.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Por dias, a família e os
empregados de Gilmar viveram seguindo os constantes mugidos de Solange, que em
sua mais nova função de relógio, os lembrava de todos os seus compromissos e
lhes impedia de atrasar um segundo que fosse. A vaca ditava os horários de
acordar, trabalhar, almoçar, estudar e cortar as unhas do pé. Gilmar passou a
ser conhecido como o homem fumante mais pontual da cidade, assim como sua
esposa, Dona Maria, tornou-se a ouvinte de músicas francesas mais responsável e
eficaz em suas tarefas.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Contudo, a notícia da vaca
relógio logo se espalhou por toda Fatiganha. Os vizinhos de Gilmar passaram a
visitar Solange, a vaca, que lhes mugia lembrando-lhes sempre das dezenas de
compromissos marcados pontualmente dos quais não podiam se esquecer. Fascinado
ao ouvir as histórias da sábia bovina, Ferdinando Soslaio, o prefeito da
cidade, que traía a esposa com a mulher do padeiro, foi visitar a família de
Gilmar. Ofereceu-lhe uma boa quantia de dinheiro em troca da vaca. Dinheiro
este que havia sido desviado das reformas do hospital público no qual o Doutor
Renato, que era canhoto, atendia seus pacientes.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Sem saber das canhotas origens do
pagamento, Gilmar aceitou o acordo e vendeu a vaca ao prefeito Ferdinando, que
voltou a trair a esposa com a mulher do padeiro naquele mesmo dia. Solange, a
vaca, foi colocada num pedestal de mármore polido na praça central da cidade.
Pedestal este que havia sido esculpido por Serafim, que era artista há anos por
puro prazer de esculpir.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Em seu novo posto, a vaca passou
a trabalhar como relógio de toda a cidade. Emitia seus melancólicos mugidos
todos os dias, nos quais lembrava os cidadãos dos horários para acordar,
trabalhar, almoçar, estudar, ir ao banheiro, mascar chicletes, levar o lixo
para fora, preparar o jantar, fazer as tarefas escolares, assistir ao jornal
local, trabalhar mais um pouco, dormir e acordar novamente no dia seguinte. A
cidade de Fatiganha tornou-se conhecida por possuir os cidadãos mais
responsáveis e pontuais de toda a América Latina, a qual engloba torno de vinte
países conhecidos pelos seres humanos.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Por meses, Solange, a vaca, ditou
os horários da cidade. O relógio em seu interior jamais parava de funcionar.
Com o tempo, tornou-se conhecida e respeitada por toda a população das
redondezas. Turistas e repórteres apareciam todos os dias, fascinados pela
pontualidade intrínseca da malhada criatura.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Solange, a vaca, não apenas
tornou a cidade pontual e organizada. Trouxe investidores e consumidores em
excesso, os quais enriqueceram todos os comerciantes de Fatiganha. Aglomerações
de humanos amontoavam-se em torno do animal, venerando-lhe como uma verdadeira
rainha bovina.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Eis aqui o momento da história em
que Dona Rita fez uma pausa. Foram necessários alguns segundos para que ela
mastigasse mais um pouco de folhas de hortelã e contasse o trágico fim que teve
a história de Solange, a vaca.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Hoje, após anos passados do
ocorrido, a polícia concluiu o motivo da tragédia. Mas naquela época, ninguém fazia
a mínima ideia do que causara a grande explosão. Afinal, tão fissurados pelos
constantes tiques e taques do relógio, nenhum cidadão jamais preocupou-se em
descobrir o que o relógio realmente era. Pois o relógio não era um relógio. Ou
ao menos não um relógio comum. O que Solange, a vaca, havia engolido no pasto
era, na verdade, uma bomba. Programada pacientemente para explodir quando uma
multidão de seres humanos se aglomerasse a seu redor.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">A potente potência da bomba não
devastou apenas os quatro estômagos de Solange, a vaca, mas também toda a área
de Fatiganha, dizimando toda a população. Gilmar, Maria, Olavo, Vanessa,
Ferdinando Soslaio, Serafim, Doutor Renato, o padeiro, a mulher do padeiro e
todos os outros pontuais e responsáveis cidadãos foram mortos num piscar de
olhos bovinos.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Dona Rita terminou a história sem
me fornecer maiores explicações. Indignei-me, perguntando impaciente sobre os
detalhes da bomba relógio, da explosão e das consequências desastrosas. Rita
enfureceu-se e me fitou de modo impaciente. “Como pode, após ouvir esta
história, continuar a me fazer as perguntas erradas?” disse enraivecida. Não
entendi a princípio o que ela queria dizer. Naquele dia, fui embora de sua casa
com a cabeça perdida em pensamentos obscuros.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Foram necessários três anos, sete
meses, oito dias, doze horas e um texto para que eu finalmente entendesse quais
foram as razões que levaram à tragédia de Fatiganha. Entendo enfim que os
Fatiganhenses são a prova viva (agora morta) da estupidez humana. Deram tanta atenção a uma vaca, e se esqueceram de seus próprios detalhes. A relevância de suas vidas não estava no fato da bomba-relógio ou da repercussão de Solange. Mas sim nos
fatos de que Gilmar era fumante, Maria ouvia músicas francesas, Olavo era noivo
de Vanessa, Vanessa era filha do vizinho, Ferdinando traía a esposa com a
mulher do padeiro, Renato era canhoto, Serafim era artista por paixão, e que a
América Latina engloba vinte países conhecidos por humanos. Tão vidrados em
seguir os mugidos melancólicos da vaca, os Fatiganhenses não levaram em conta o
detalhe mais crucial: Vacas são extremamente traiçoeiras, e nenhuma delas
poderia levar a cidade a um caminho que não fosse a tragédia.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-f7oR32ar-sM/UhbW9wkwFCI/AAAAAAAAAIE/ZqkiY-7riTw/s1600/coracao-relogio-preso-na-teia-de-aranha-fe4a3.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="150" src="http://4.bp.blogspot.com/-f7oR32ar-sM/UhbW9wkwFCI/AAAAAAAAAIE/ZqkiY-7riTw/s200/coracao-relogio-preso-na-teia-de-aranha-fe4a3.jpg" width="200" /></a><span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Sorrio então ao me lembrar de
Dona Rita, mas não apenas de Rita em si. Lembro-me agora de Dona Rita, que mastigava
folhas de hortelã. Pois humanos não são um. Humanos são sempre “um que”. Mesmo
que um que venere uma vaca.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Meus dedos param de digitar e me
assusto de repente. Ouço então um sonoro e aconchegante “Tic-tac” dentro de
mim. Não sei de onde veio, nem o que significa. Mas sei que meu fim é o mesmo
que o de Solange (a sogra, não a vaca, que faleceu há três meses). Talvez,
leitor, quando terminar este texto, minha bomba-relógio já tenha explodido.
Peço então que ouça seus próprios tiques e taques e seja “um que” dê orgulho.
Afinal, cedo ou tarde, a bomba-relógio dentro de seu estômago também irá
explodir, quer você seja Solange, ou um mero Fatiganhense.<o:p></o:p></span></div>
Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-78701267989209287592013-07-20T19:48:00.000-03:002013-12-03T12:06:27.335-03:00O Reino das Paçocas Ilegais<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> Conta-se
que há muitos anos atrás (ou talvez à frente) existiu um reino mágico onde
mortais e paçocas viviam em perfeita harmonia. Numa terra onde flores
desabrochavam em açúcar e nuvens se desfaziam em saborosos melaços, tais
simpáticas guloseimas de amendoim transmitiam seus conhecimentos aos humanos,
os ensinando a viver de forma doce e entusiástica. Crianças e mini paçocas
cantavam cantigas de roda e corriam sob raios ensolarados todos os dias,
acreditando que a vida era um misto incontável de açúcar e felicidade.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Nem mesmo a “idealidade” de
Platão esboçaria uma sociedade tão perfeita.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> Mas foi então que o Rei Amargus XV
contra tal se rebelou. Acreditou que as paçocas desviavam a atenção dos humanos
de tarefas produtivas, levando-os a um caminho dominado pela criatividade nada
lucrativa.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Num temível acesso de fúria, o
rei decretou uma nova lei. Paçocas haviam se tornado ilegais. A mera existência
de tais guloseimas amendoadas tornou-se expressamente proibida. Os soldados do
monarca devastaram suas terras, expulsando não apenas as paçocas, mas qualquer
mero vestígio da herege arte açucarada.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Amargus ordenou que a única
expressão artística legalmente permitida fossem representações de sua própria
face em bustos de pedra. Estátuas em sua homenagem foram esculpidas por todos
os cantos, ao passo em que muros foram erguidos nos limites do reino para impedir
que qualquer paçoca rebelde ousasse tentar sorrateiramente ultrapassar a
fronteira.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Nem mesmo a “insensibilidade” de
Maquiavel suportaria tal governo como forma de política.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> Professores foram encomendados via
Sedex, aplicados em cursos nos quais ensinariam os súditos a direcionar todas
as suas atividades diárias em direção a fins lucrativos. A preocupação com a
produtividade de seu próprio tempo tornou-se parte do cotidiano de plebeus e
palhaços. E por décadas, nenhuma outra paçoca foi encontrada.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Anos se passaram, até que um
grupo de seis jovens gnomos resolveu explorar os limites do reino. Guiados por
rumores trazidos pelos ventos, que sussurravam lendas antigas sobre seres
adocicados que um dia haviam habitado aquelas terras.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Nem mesmo a “aventuracidade” de
Tolkien entenderia o anseio em descobrir o além do feudo.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> Foi numa noite de três luas que os
sonhadores indivíduos encontraram um segredo que há tempos ansiava por ser
revelado. Uma trilha, sinuosa e discreta, que se arrastava para além das fronteiras.
Os gnomos se espantaram ao notar que a trilha era feita de nada menos do que
paçocas. Sim... singelos pedaços cilíndricos de doce amontoados linearmente,
que levavam a algum destino inimaginável.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Nem mesmo a “misteriosidade” de
Conan Doyle entenderia a atratividade do mistério a ser revelado.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> Aguçados, os gnomos seguiram a
trilha, em rápidos passos, antes que a Guarda Real os impedisse de instigar o
desconhecido.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Nem mesmo a “fertilidade” de C.S.
Lewis poderia imaginar a felicidade de tais seres ao alcançar seu destino.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> Uma pacata vila encantada, onde as
linhagens de paçocas sobreviventes refugiavam-se em perfeita harmonia. Viviam
em segredo, num esforço incansável de preservar a doçura que tanto lhes fora
reprimida. Fascinados, os gnomos se uniram a suas sinfonias, divertindo-se por
dias e noites, nos quais declamavam açúcar e comiam poesia.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> Não tardou, contudo, que os plebeus
do reino notassem o sumiço dos seis pequenos seres. Aguçados pela curiosidade,
pouco a pouco os cidadãos partiram em busca do paradeiro dos gnomos. À medida
que encontravam a trilha de paçocas e alcançavam a pacata vila, encantavam-se
de tal maneira que não voltavam jamais. A população do reino aos poucos
transbordava em direção ao povoado.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> Nem mesmo a “raivosidade” de George
Martin seria capaz de compreender o sentimento que dominou Amargus no momento
em que notou que seus súditos cada vez mais o abandonavam.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> Ao descobrir sobre o refúgio
açucarado, o poderoso monarca ordenou que seu exército marchasse em direção a
vila e exterminasse definitivamente todas as paçocas. Contudo, suas palavras
ecoaram pelo salão deserto. Colocou seus óculos para que pudesse enxergar
melhor e constatou a dura verdade.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Não havia mais exército. Não
havia mais soldados. Todos haviam fugido. Cercado por suas estátuas e bustos de
mármore, mergulhado em sua miopia, o monarca nem percebera como lentamente
terminara em repleta solidão. Seu reino agora nada mais era do que terras
inabitadas, enquanto a população da vila das paçocas crescia estrondosamente.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> O reino tornou-se nada, e o nada
tornou-se reino.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> Foi em seu auge momentâneo que, num
lampejo amendoado, a terra das paçocas desapareceu. O reino se escondeu por
trás de nuvens de algodão doce e nunca mais foi encontrado por ninguém.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-iqiyH-67ROw/UesTEa7ORtI/AAAAAAAAAHs/wVCjtIB1pu8/s1600/pa%C3%A7oca.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" height="127" src="http://2.bp.blogspot.com/-iqiyH-67ROw/UesTEa7ORtI/AAAAAAAAAHs/wVCjtIB1pu8/s320/pa%C3%A7oca.jpg" width="320" /></a><span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> Desamparado, Amargus vagou por anos
em repleta solidão. Mesmo quando, por acidente, encontrou a trilha secreta, não
pôde enxergá-la. Sua mente era tão desprovida de açúcar que, ao olhar para as
cilíndricas guloseimas, tudo que enxergava eram pequeninos tocos de madeira.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Sem nada a se apegar que não sua
mente sem inventividade, o monarca vagou por terras longínquas, onde encontrou
novos súditos e deu início a uma nova civilização rumo ao desenvolvimento
(dessa vez, sem paçocas para lhe perturbar). Uma civilização sem criatividade
da qual, contudo, fazemos parte.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> Dizem por aí que a trilha das
paçocas ainda existe, mas apenas pode ser encontrada por indivíduos de mente
adocicada. Num mundo onde açúcar não mais se declama, e poesia não mais se
come, cada vez mais o reino das paçocas se distancia.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> Mas rumores sussurram que, vez ou
outra, jovens de mentes diferenciadas desaparecem sem explicação. E quando
voltam (se é que voltam) relatam histórias sobre um reino onde tudo é doce, e
onde a felicidade se colhe em árvores de amendoim.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Nem mesmo a “insanidade” de Lewis
Carrol poderia negar que tais rumores parecem utópicos e ilógicos por demais.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> Mas creio que ainda existem gnomos
cansados de admirar os bustos de pedra de seus reis, que buscam por um mundo
novo, repleto de magia. Seres pequeninos que entendem que o mundo onde vivem
não pode permanecer em amargurada ignorância.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Afinal...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Nem mesmo a “adocidade” de uma
paçoca arriscaria viver num mundo onde a mente é tão diabética.<o:p></o:p></span></div>
Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-24684428372548174492013-07-17T23:26:00.002-03:002013-12-03T12:05:51.096-03:00Losango Não Encontrado<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Triângulos
Metamórficos<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Tabloides
feitos de pó.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Do
pó viestes, mas não retornarás.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Fecharam
as portas que levam para trás.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-7RI0qXlVRzU/UedSNF8nbjI/AAAAAAAAAHc/Jx0J7kl31Zg/s1600/tri%C3%A2ngulos+metam%C3%B3rficos.PNG" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" height="200" src="http://2.bp.blogspot.com/-7RI0qXlVRzU/UedSNF8nbjI/AAAAAAAAAHc/Jx0J7kl31Zg/s200/tri%C3%A2ngulos+metam%C3%B3rficos.PNG" width="195" /></a><span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Triângulos
Metamórficos<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Sangue
se espalha pelo chão.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">O
linóleo reflete o exausto detetive<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Que
com arestas fugitivas agora convive.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Triângulos
Metamórficos<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Assassinaram
a hipotenusa.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Centauros
que voam, dragões que galopam<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Nos
não tão crespos cachos de Medusa.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Quadrados
me questionam<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Por
que triângulos num poema?<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Não
fui eu, não foi Platão,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Nem
mesmo a lógica do sistema.<o:p></o:p></span></div>
<span style="font-family: 'Times New Roman', serif; text-align: justify;">Foram
triângulos metamórficos e um círculo sonhador.</span><br />
<div>
<br /></div>
Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-3157048694999320682013-07-10T23:47:00.001-03:002016-02-04T17:01:52.280-03:00A Verdade Sobre as Maçãs<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-01L7cOXkP9U/Ud4cVQPqxZI/AAAAAAAAAHM/UwaT2P1z1zE/s1600/ma%C3%A7%C3%A3aa.PNG" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="141" src="https://2.bp.blogspot.com/-01L7cOXkP9U/Ud4cVQPqxZI/AAAAAAAAAHM/UwaT2P1z1zE/s200/ma%C3%A7%C3%A3aa.PNG" width="200" /></a><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">A
princípio, nada mais do que saborosos frutos de angiospermas orgulhosas. A
fundo, representações em miniatura da vermelhidão de nosso universo. Ao
passado, incluída na lista de mais fáceis palavras que crianças aprendem a
escrever. Ao futuro, na lista de mais intimidantes refeições que idosos com
dentes postiços temem saborear. Ao presente, apenas uma simples maçã.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Há muito a se dizer sobre um
indivíduo pelo modo como ele a abocanha. Carentes de atenção exibem um crocante
som chamativo. Tímidos repartem o fruto em partes antes de ingeri-lo. Mentes
pequenas o devoram de uma só vez. Sonhadores dão-lhe apenas uma simples
mordida, e a estampam no logo de sua empresa de eletrônicos. O mísero crocante
som causado pela mordida nos revela anseios e desejos dignos de qualquer clímax
subentendido.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-rRSwzMXOLTw/Ud4cQp7KGjI/AAAAAAAAAG0/oY5phmnroLM/s1600/ma%C3%A7%C3%A3+branca.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><img border="0" height="179" src="https://1.bp.blogspot.com/-rRSwzMXOLTw/Ud4cQp7KGjI/AAAAAAAAAG0/oY5phmnroLM/s320/ma%C3%A7%C3%A3+branca.jpg" width="320" /></span></a><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Mas o segredo mais bem guardado por
tais frutas é o de que são elas que regem nossas vidas. Mesmo os mais
ignorantes seres humanos seguem seus passos sob a Teoria das Três Maçãs. E eis
que a explico a leigos e juristas...<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> A primeira delas seria a “Maçã
Envenenada”. Sim, a mesma que enviou a pálida princesa de lábios rúbeos a um
sono profundo nas histórias encantadas. É a maçã que representa nossa infância.
Um fruto que representa não o envenenamento em si, mas sim a facilidade com que
os problemas da vida podem ser superados. A noção de que basta algo mágico,
como um beijo de amor verdadeiro, para cessarmos qualquer efeito maligno. A
ideia espontânea na qual crianças podem quebrar qualquer maldição. É com olhos
brilhosos que caminhamos em nossos primeiros anos com a noção de que tudo é
belo, e que dificuldades podem facilmente ser superadas (mesmo que com a ajuda
de sete fartos anões).<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-8BaF7RhDeA8/Ud4cUJN6z3I/AAAAAAAAAHE/EJQsHg6rrB0/s1600/ma%C3%A7%C3%A3+%C3%A9rica.png" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><img border="0" height="234" src="https://2.bp.blogspot.com/-8BaF7RhDeA8/Ud4cUJN6z3I/AAAAAAAAAHE/EJQsHg6rrB0/s320/ma%C3%A7%C3%A3+%C3%A9rica.png" width="320" /></span></a><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> A segunda etapa em nossa teoria
responde à “Maçã do Edén”. O momento crucial em que cansamos de viver na
ilusória utopia e ansiamos por enxergar o mundo de nossa própria maneira. O
fruto sedutor que nos atrai da mesma maneira que atraiu a ametódica Eva, nos
trazendo a cobiça irrefreável de experimentar o “Novo”. Na pérfida adolescência
em que nos cansamos de ser ordenados por forças exteriores a nós e mordemos a
maçã da independência, sendo guiados única e exclusivamente pelo desejo.
Deixamos de lado o mundo que foi criado para nós, na intenção de criar o nosso
próprio a nossa maneira.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-jQv12Uh1XS0/Ud4cTHZdXiI/AAAAAAAAAG8/YJ0ZfbNTYlY/s1600/ma%C3%A7%C3%A3+isaac-newton.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><img border="0" height="320" src="https://4.bp.blogspot.com/-jQv12Uh1XS0/Ud4cTHZdXiI/AAAAAAAAAG8/YJ0ZfbNTYlY/s320/ma%C3%A7%C3%A3+isaac-newton.jpg" width="248" /></span></a><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> E assim partimos à maturidade, na
qual a “Maçã de Newton” finalmente nos aguarda. O fruto crucial que despenca em
nossos crânios, do mesmo modo que se chocou há tempos na cabeça do pulcro
cientista, causando um severo distúrbio no qual o indivíduo passa a acreditar
que o mundo é regido por leis científicas e que a magia não passava de uma
ilusão da infância. Antes, o mundo era movido por feitiços. Agora, por física.
A ciência tampa nossos olhos e desaprendemos a sonhar.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Vermelha e sedutora, a maçã nos faz
nascer, sonhar e morrer, iludidos por não perceber que a semente não se
encontra no fruto, mas em nosso próprio interior, esperando apenas que algum
estímulo a faça germinar.<o:p></o:p></span></div>
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Vivemos pelas maçãs. Crescemos pelas
maçãs. Somos maçãs... Somos maçãs? Sim. E é por isso que prefiro lasanha.</span></div>
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span>
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><br /></span>
<br />
<o:p></o:p>
Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com14tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-63643968952459231782013-07-07T17:43:00.000-03:002013-07-11T22:32:06.778-03:00A Fabulosa Vida de Susana Bones<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> Certa
vez um homem sábio me disse que a vida é como uma colmeia sob os galhos de uma
macieira em pleno verão. Nunca compreendi tal comparação, mas ela não se faz
necessária nesta história. Escrevo aqui na intenção de compartilhar minha
extrema afeição por uma das personagens de Joanne Rowling. A intrínseca
senhorita Bones.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-ynVJNZaDqSA/UdnRWIiCSZI/AAAAAAAAAGc/KIO68ZviD4A/s1600/suzanaaa.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="150" src="http://2.bp.blogspot.com/-ynVJNZaDqSA/UdnRWIiCSZI/AAAAAAAAAGc/KIO68ZviD4A/s200/suzanaaa.jpg" width="200" /></a><span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> Em meio a um universo repleto de diversos
personagens, a escolha de tal garota parece nada mais do que inapropriada e
desprovida de sentido. Contudo, tenho guardados numa pasta de cor amarela
alguns arquivos que revelam minhas razões para idolatrar esta humilde criatura.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> É fato quase inquestionável que a
jovem Susana trouxe aos fãs da saga a primeira impressão do que é ser
selecionado para uma das casas de Hogwarts. Mesmo que a desagradável Ana Abott
tenha sido a primeira aluna a ser chamada pela professora McGonagall, todos
sabem que, numa sequência de fatos, o segundo é quem carrega o árduo fardo de
não apenas enfrentar a tarefa, mas também de se igualar ao primeiro. E Susana
triunfalmente ingressa na Lufa-Lufa com ligeira ansiedade na página dos livros,
e um belo sorriso na tela dos filmes.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> Não percebem? A real importância de
tal fato? É sabido que Lufa-lufas são a classe social subalterna da saga,
considerados desnecessários e muitas vezes mencionados em piadas maldosas que
envolvem excrementos de acromântulas. Mas a corajosa senhorita Bones bravamente
estampa tal título, abraçando a Lufa-Lufa como seu lar. Tal grupo de rejeitados
alunos tem sua importância estampada logo de cara nos pequeninos tímpanos ou
globos oculares de qualquer jovem criança que conheça a saga pela primeira vez.
O pomposo chapéu seletor cita a casa dos texugos antes que todas as
outras. É através da jovem de cabelos
ruivos que os amarelos de Hogwarts são fixados na mente do jovem Potterhead. As
palavras de Rowling dizem que “Susana saiu depressa e foi se sentar ao lado de
Ana”, mas deixam nas entrelinhas que aquele era um dos momentos mais simbólicos
de sua vida. A mensagem da garota é clara e direta ao público: “Vocês podem nos
ignorar, mas estamos aqui. E temos orgulho disso.”<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> Talvez seja esta uma das maiores
lições contidas em toda a saga. Ela não foi A Garota que Sobreviveu. Não foi a
aluna mais brilhante da classe. Não se destacou nos campos de quadribol. Susana
não alcançou a glória eterna. Mas em seus breves segundos de fama, apresentou
com orgulho a casa a qual pertencia, registrando-se para sempre na mente dos
fãs de Joanne.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> Um centauro dinamarquês, ao ler os
parágrafos acima, há de achá-los mal contados e sem sentido. Não apenas pelo
fato de não falar fluentemente minha língua, mas também pelo fato de não compreender
um dos mais inquestionáveis dogmas que rege a ficção. A pomposa ideia de que
não existem protagonistas. Tal conceito é uma formosa ilusão criada pelos
autores, que sentem a necessidade de se apegar a um de seus personagens mais do
que aos outros. Mas independente de seus feitos, a importância atribuída a cada
um deles é exatamente a mesma.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-EHem5qNJvjc/UdnRoyTycOI/AAAAAAAAAGk/vlALpdxWwnI/s1600/susanaaaa.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" height="85" src="http://1.bp.blogspot.com/-EHem5qNJvjc/UdnRoyTycOI/AAAAAAAAAGk/vlALpdxWwnI/s200/susanaaaa.jpg" width="200" /></a><span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Mesmo que grande parte da vida de
Susana não esteja inscrita nas palavras de Rowling, a nobre garota sabe que
exerceu seu papel com eficiência. Compreende enfim que possui sua função neste
mundo, e que não há diferença entre derrotar o Lorde das Trevas, ou derrotar os
obstáculos de uma vida cotidiana. Ambos querem te destruir. A diferença está
apenas na atenção que isso atrai a sua história. Assim como não há diferença
entre cativar uma pessoa ou cativar milhões. Elogios alheios nunca serão tão
importantes como elogios vindos de si próprio.</span><br />
<span style="font-family: 'Times New Roman', serif;"> Ao caminhar pela estrada empoeirada
que leva a meu destino, carrego na mala um globo de vidro embalado com plástico
bolha. Nele, guardo a memória de Susana, que me incentiva a seguir em frente
todos os dias, me lembrando sempre de que minhas origens e as circunstâncias
não definem quem realmente sou. Basta que eu me lembre que não importa o que os
outros pensem, ou mesmo qual ídolo venerem. Na história contada em minha mente,
cabe a este jovem complexo fazer de mim mesmo meu próprio protagonista.</span></div>
Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-49534836885482446152013-07-05T23:49:00.000-03:002013-12-03T12:06:27.329-03:00O Curioso Caso do Professor Castor<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> E
nas entranhas da academia, vivia um professor castor. Com seus simpáticos
incisivos sorridentes, transbordava simpatia aos seus alunos, ensinando métodos
efusivos de como se constrói um dique para demarcar represas de conhecimento.
Os maravilhados alunos assistiam com alegria os ditames do sábio castor, que
lhes indicava um caminho no qual conceitos e valores se unem num esforço mútuo
de alcançar a verdade.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">O velho roedor por dias levou os
estudantes a acreditar que a verdade estaria nos limites da represa, e que de
um bem construído dique nada escaparia. Num local onde a maioria dos educadores
eram lobos sedentos de sangue, o carisma sem igual do castor se destacava em
meio aos docentes. Os ingênuos jovens o elegeram como seu líder, fantasiados
por sua ideologia.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> Mas verdades mal contadas
rapidamente se apodrecem. O castor era pomposo em seus discursos, mas fétido em
suas ações. As ideias demagógicas cederam à primeira forte tempestade, fazendo
o dique se romper. O conhecimento represado escorreu-se porta afora, e os
alunos assistiram espantados a farsa revelada. Os métodos eram falsos, assim
como o próprio professor, que não sabia construir dique nenhum. Policiais o
algemaram e jornais noticiaram de forma sensacionalista a dura verdade: O
professor castor era, na verdade, um esquilo.<o:p></o:p></span></div>
<br />
<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-3MCGY0PPOno/UdeFXLVwuyI/AAAAAAAAAGM/VfrXBgeNtj0/s1600/castor.PNG" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="261" src="http://2.bp.blogspot.com/-3MCGY0PPOno/UdeFXLVwuyI/AAAAAAAAAGM/VfrXBgeNtj0/s320/castor.PNG" width="320" /></a></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<i><span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> <o:p></o:p></span></i></div>
Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-73657905673539245832013-07-03T13:51:00.000-03:002016-02-03T03:50:30.189-03:00Hélio e Outono - Uma férvida história sobre física e sonhos<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "times new roman" , "serif";"> </span><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> “Era uma vez” talvez não seja a melhor maneira de iniciar essa história. Mas não há como voltar atrás, pois foi com tais que dei início ao parágrafo. Outono foi um jovem nascido numa manhã de verão. Sentenciado desde seu batismo a aprender que, assim como as folhas, tudo cai constantemente ao longo da vida.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify; text-indent: 35.4pt;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;">Ainda jovem, foi forçado pelos pais a estudar todas as possíveis ciências da natureza. Como físicos renomados, ambos trabalhavam dia e noite na intenção de elaborar a Nova Lei da Gravidade, uma tese que propunha que a força gravitacional seria bem mais eficiente do que afirmara Newton. Assim, por toda a vida, seus genitores o estimularam a abraçar a gravidade como a uma irmã, a qual um dia lhes renderia um formoso prêmio Nobel.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Os pais de Outono não o ensinaram a andar, mas sim a cair. Era importante para eles provar como a gravidade afetava os bebês. Não o incentivaram a praticar esportes como alpinismo ou asa-delta, mas sim atividades como escavação de túneis subterrâneos, para que estivesse sempre o mais próximo possível da fonte gravitacional. Não permitiam que ele emagrecesse, mas sempre o incentivavam a acumular massa corporal, para que seu peso o mantivesse fixo ao chão.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> E assim... o jovem Outono levava sua vida, sem grandes expectativas ou ilusões, pois diziam rumores que tais letais fantasias poderiam fazer um ser humano flutuar. E se Outono alguma vez ousasse desafiar a física, seus pais jamais o perdoariam.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-W6lX3V88YJ4/UdRDDxTpeqI/AAAAAAAAAFQ/-t24RekzT1g/s447/1238444025939_f.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><img border="0" height="320" src="http://4.bp.blogspot.com/-W6lX3V88YJ4/UdRDDxTpeqI/AAAAAAAAAFQ/-t24RekzT1g/s320/1238444025939_f.jpg" width="237" /></span></a><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Mas sabem bem como a vida funciona. Nos contentamos com iogurte desnatado, até que um anjo nos apresente o sorvete de baunilha. Foi num dia chuvoso de primavera, que entre as confusas trilhas da tabela periódica, ao brincar inocentemente no laboratório da família, conheceu o discreto Hélio. De tão tímido, se incolorava em todo seu inodor. Talvez fosse o 4 em sua massa atômica, ou talvez o modo singelo como os colegas o chamavam de He. A questão é que bastaram segundos para que Outono se afeiçoasse e o tomasse como amigo.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Dizem que quando se encontra alguém especial, este nos deixa nas nuvens. Curiosamente, Hélio realmente exercia tal efeito. Durante tardes e noites subsequentes, divertiu o jovem Outono com acrobacias e truques, nas quais enchia bexigas coloridas e as erguia magicamente ao infinito, como se nada no mundo pudesse detê-las. O intrigava a maneira como Hélio causava efeitos em seu corpo, deixando-o nervoso de tal maneira que a voz despontava fina e ruidosa de suas cordas vocais.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Foi então que a amizade num sonho resultou. O intrigante Hélio convenceu seu parceiro de que juntos nada os deteria. Cobiçavam a ideia de fugir durante a madrugada, com Outono amarrado a centenas de balões que ergueriam seu peso em direção ao céu. Hélio os levaria até o astro mais longínquo, onde juntos poderiam desfrutar de seus dias e realizar seus sonhos mais inimagináveis. Nunca mais haveria que ouvir os pais recitando-lhe fórmulas e leis matemáticas em preto e branco. Seu mundo seria repleto de cores, as quais ilustrariam sua vida da maneira como bem quisesse. O jovem seria livre em fim.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Ansiosamente, guardou todos os seus sonhos na bagagem. Mal sabia que tais o arruinariam, ainda que nem eu mesmo acredite que tenha agido erroneamente.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Foi às três e sete da manhã que os amigos tentaram partir. Uma fuga rápida da janela mais alta do laboratório de seus pais. Hélio triunfalmente erguia dúzias de bexigas coloridas, as quais erguiam o alegre Outono cada vez mais para o alto.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Mas o garoto já não era mais criança. Repletos de desesperança, os pais urraram seu nome ao acordar e fitar o ponto que indicava seu filho em direção a luz do luar. Rogaram-lhe a maldição da maturidade, para que a fantasia o expulsasse em direção ao mundo real. Foi no quebrar destas ilusões que as leis da ciência tomaram conta de si. A inércia, o empuxo e a densidade se uniram num uníssono sorriso maquiavélico, ao contemplar as ações da poderosa gravidade.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> A tão invejosa irmã, agarrou-se a Outono com toda sua sagacidade, buscando enfim provar que os pais estavam certos e que Newton nunca imaginara a real magnitude de tal depressiva força. Hélio tentou resistir. Pediu ao amigo que acreditasse no impossível e que não desistisse de lutar. Mas já era tarde.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-4-oGf4URZm4/UdRGEoNdhvI/AAAAAAAAAFo/xc6sc3nQtP4/s340/passos-para-aprender-estudar-fisica.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><img border="0" height="113" src="http://4.bp.blogspot.com/-4-oGf4URZm4/UdRGEoNdhvI/AAAAAAAAAFo/xc6sc3nQtP4/s200/passos-para-aprender-estudar-fisica.jpg" width="200" /></span></a><span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"> Os sonhos na bagagem de Outono eram pesados demais para que pudesse aguentar. No momento em que a gravidade os envolveu, ambos despencaram juntos em direção ao chão pedregoso. O estalar de seus ossos foi superado apenas pelo forte quebrar de todos os seus devaneios.<o:p></o:p></span></div>
<div style="text-align: start;">
<span style="font-family: Georgia, Times New Roman, serif;"><span style="text-align: justify;"> </span><span style="text-align: justify;">Senhor Pai e Senhora Mãe haviam vencido enfim. Após anos, haviam finalmente provado sua tese. A Nova Lei da Gravidade agora se estampa em livros de física por todo o universo. A glória eterna lhes foi concedida, e cientistas os aclamam mundialmente. Newton sorri em seu túmulo, orgulhoso. No canto da sala de estar, um formoso prêmio Nobel os enche de orgulho. Lustroso, dourado... encharcado pelo sangue de Outono que pinga vagarosamente todos os dias manchando o carpete.</span></span></div>
Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com18tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-57336302676230598862013-07-03T01:56:00.002-03:002016-01-24T12:39:27.311-03:00Quando ergue teus olhos<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a href="http://4.bp.blogspot.com/-auEP4uVwHuU/UdOu2QIV1YI/AAAAAAAAAEU/BReNukIZE7c/s320/olho_azul.jpg" imageanchor="1" style="clear: left; float: left; margin-bottom: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="198" src="http://4.bp.blogspot.com/-auEP4uVwHuU/UdOu2QIV1YI/AAAAAAAAAEU/BReNukIZE7c/s200/olho_azul.jpg" width="200" /></a></div>
<div class="MsoNoSpacing" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Tua
mãe diz que seus olhos são belos por terem sido herdados de sua avó. Sua avó
afirma que a beleza deles é herdada de um tio distante. Seu irmão acredita que
seus olhos se embelezam de acordo com as vestes que usa. Sua irmã já pensa que
os dela são mais belos que os seus. Seu namorado afirma que a magia deles é
revelada quando seus sentimentos se afloram. Seu ex já acredita que é no
desabrochar que eles ficam mais atraentes. Seu oculista lhe diz que a cor
deles se destaca por trás das lentes. Geneticistas afirmam que tudo não passa
de um gene recessivo. Os artistas acreditam que seus olhos refletem a beleza de
sua alma. Os filósofos se perguntam se por trás deles não se esconde uma
dialética ainda maior. Palhaços me dizem que suas pupilas se dilatam quando ri
constantemente. Mixólogos me convencem de que tal olhar não passa de uma tática
de sedução. Minha mãe me disse que seus olhos combinam com os meus. Meu
cachorro apenas os observa, porque não aprendeu a falar. Já eu, desconsidero
todas as afirmações de tolos que não te conhecem realmente. A magia não está em
seus olhos. Mas sim no modo como você os ergue quando nos encontramos. Não
creio que seja intencional, mas quase nada na vida é. E não é tal verdade que
nos guia? A verdade de que não se trata dos retratos da pigmentação da alma,
mas sim dos percursos que os cílios incrivelmente descrevem em busca de seu
destino.<o:p></o:p></span></div>
Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-7624411955000882312013-07-02T12:30:00.001-03:002016-01-24T12:39:27.313-03:00Acredito que Chubble seja uma morsa<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"> </span><span style="font-family: Verdana, sans-serif;"> Talvez
seja a repentina mudança da direção dos ventos vindos de lugar nenhum, ou
talvez seja apenas uma ideia repentina que floresceu em minha mente como um
cravo cultivado da forma mais dócil possível. A questão é que surgiu-me o
pensamento obliquo de qual seria a real natureza de meu amigo Chubble. Acredito
que seja uma morsa. Não é uma ideia de toda ilógica, mas sim o resultado de
consequentes considerações que fiz sobre seus atos.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<a href="http://2.bp.blogspot.com/-SAqyVfQq8Gk/UdOwS8uArdI/AAAAAAAAAEk/a1a6lDX_Bsk/s152/morsa_cartao-r48bc89cf610d47bc8acf727ac478dde0_xvuat_8byvr_152.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><span style="font-family: Verdana, sans-serif;"><img border="0" height="200" src="http://2.bp.blogspot.com/-SAqyVfQq8Gk/UdOwS8uArdI/AAAAAAAAAEk/a1a6lDX_Bsk/s200/morsa_cartao-r48bc89cf610d47bc8acf727ac478dde0_xvuat_8byvr_152.jpg" width="200" /></span></a><span style="font-family: Verdana, sans-serif;"> Primeiramente,
é preciso que você, caro ouvinte, saiba do que se trata tal espécime. Para
início de conversa, que fique bem claro: ninguém nunca viu uma morsa. Caso um
indivíduo afirme já ter visto, trata-se de um salafrário impostor, pois morsas
não são animais que se afirme ter visto se não tiver visto realmente.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;"> Uma
morsa não é uma espécie de ave de rapina, ou muito menos um termo pejorativo
que possa ser usado para ofender alguém (embora diversas vezes seja usado com
tal intuito por biólogos do signo de sagitário). A morsa trata-se de um formoso
mamífero, que não habita desertos escaldantes nem casas de repouso religiosas.
E é por essas e outras características que acredito que Chubble seja uma morsa.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;"> Morsas
são notavelmente incapazes de desenvolver habilidades como dança ou separação
silábica de proparoxítonas. Igualmente, meu caro amigo Chubble encontra
dificuldades em realizá-las devido a sua extrema aversão a movimentos rítmicos
e professores de português.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;"> Morsas
costumam não falar mal de seus amigos pelas costas. E Chubble é do tipo de
pessoa que escreve os defeitos alheios em letras grandes numa lousa visível
diante do indivíduo.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;"> Morsas
não vivem em torno de duzentos anos. E Chubble afirma que também não viverá até
tal idade, devido a seu psicótico trauma por números iniciados pelo algarismo
2.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;"> Morsas
não pensam apenas em dinheiro. E Chubble é a segunda espécie mais desinteressada
por bens materiais que já encontrei (freiras de cabelos ruivos ocupam a
primeira posição).<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;"> Morsas
não pensam nas consequências de seus atos. Vivem por instinto. E Chubble é
considerado por muitos como o pai da frase “Siga o que seu coração diz”.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;"> Morsas
também não são adeptas a se exibir constantemente por suas qualidades. Do mesmo
modo, Chubble acredita que grandes talentos não necessitam de serem jogados
para o alto para serem descobertos.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;"> Morsas
não julgam um bom livro pela capa, ou um indivíduo pela aparência. Assim como
Chubble sempre aguarda que certa intimidade se estabeleça, antes de dar início
ao julgamento.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;"> Após
a reunião de tantas evidências, concluí que não havia como me enganar. As semelhanças
entre Chubble e as morsas eram muitas para que eu as ignorasse.<o:p></o:p></span></div>
<div style="text-align: start;">
<div style="text-align: left;">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-iHdnomY2oQI/Vpm9Q198aCI/AAAAAAAAR8U/VMOf-PusJaE/s1600/tumblr_mxc0kzqlqo1ste05mo1_500.gif" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" height="152" src="http://1.bp.blogspot.com/-iHdnomY2oQI/Vpm9Q198aCI/AAAAAAAAR8U/VMOf-PusJaE/s320/tumblr_mxc0kzqlqo1ste05mo1_500.gif" width="320" /></a><span style="font-family: Verdana, sans-serif;"><span style="text-align: justify;"> </span><span style="text-align: justify;">Contudo,
um breve impasse surgiu diante de mim, deixando-me duvidoso, por ser a única
gritante diferença entre Chubble e tais formosos mamíferos: Chubble é um exímio
admirador de queijo gorgonzola. E alguém por acaso já viu uma morsa que comesse queijo gorgonzola? Mas é claro que não! Afinal... ninguém nunca viu uma
morsa.</span></span><br />
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;"><span style="text-align: justify;"><br /></span></span></div>
<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";"><o:p></o:p></span></div>
</div>
Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-8778480098768175053.post-57467125002006381912013-07-02T12:27:00.000-03:002013-12-03T12:05:51.101-03:00As Sete Facas de Glória<div class="MsoNormal" style="text-align: justify;">
<span style="font-family: 'Times New Roman', serif;">Sete
facas possuía,</span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Sete
ações executou.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<a href="http://1.bp.blogspot.com/-ZtRkmzv_Kt0/UdMaU7p-KJI/AAAAAAAAADA/yMo2xL6kEM0/s500/kit-03-facas-de-arremesso-cor-preta-com-bainha_MLB-O-3851842369_022013.jpg" imageanchor="1" style="clear: right; float: right; margin-bottom: 1em; margin-left: 1em;"><img border="0" height="200" src="http://1.bp.blogspot.com/-ZtRkmzv_Kt0/UdMaU7p-KJI/AAAAAAAAADA/yMo2xL6kEM0/s200/kit-03-facas-de-arremesso-cor-preta-com-bainha_MLB-O-3851842369_022013.jpg" width="200" /></a><span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Dotada
de extasia,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Glória
não hesitou.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Com a
primeira, matou seu passado.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Dotado
de perturbações.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">A
enfermeira, o ex-namorado,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Lançados
aos tubarões.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Com a
segunda, matou seus pais,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Culpados
por sua indiferença.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Valores
prontos se esvaíram,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Libertando
enfim sua crença.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Com a
terceira, matou jornalistas,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Independente
da ética ou ocasião.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Não
aguentou que tais moralistas<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Limitassem
sua opinião.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">A
quarta e a quinta se uniram,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Como
se fossem uma só.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Em
dois golpes, matou seu futuro,<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">E o
prazer de tornar-se avó.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<br /></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Não
foi surpresa que a última fosse usada em suicídio.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">O
único erro de Glória foi matar-se antes do fim.<o:p></o:p></span></div>
<div class="MsoNoSpacing">
<span style="font-family: "Times New Roman","serif";">Da
sexta faca, logicamente, ela havia se esquecido.<o:p></o:p></span></div>
<span style="font-family: 'Times New Roman', serif;">A sexta
ação não concluída é o que resta para mim.</span>
Felippe Barbosahttp://www.blogger.com/profile/00476515975320722529noreply@blogger.com1